Maçonaria e Memória: Um vínculo esquecido, elos perdidos

Freemasonry and Memory: A forgotten bond, missing links

Ivan Antônio Pinheiro

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brazil

ivan.pinheiro@ufrgs.br

ORCID: 0000-0002-5455-2711

Recepção: 15 de abril de 2024/Aceitação: 24 de maio de 2024

doi: https://doi.org/10.15517/rehmlac.v16i2.54824

Palavras-chave

Memória, Maçonaria Operativa, Maçonaria Especulativa, Transição

Keywords

Memory, Operative Freemasonry, Speculative Freemasonry, Transition

Resumo

Na Maçonaria a ars memoriae já há tempos encontra-se oculta em meio às ritualísticas, ora nas entrelinhas das Artes Liberais, ora por entre as Virtudes Cardeais. Todavia, a sua importância pode ser ainda maior se explicar a transição da Fase Operativa à Especulativa, hipótese aventada por Frances A. Yates. Ao seguir essa trilha, este estudo analítico-crítico, lastreado na literatura traz uma hipótese inusitada: as Fases Operativa e Especulativa podem ter sido concomitantes ou, com maior ousadia especulativa, tendo por base a historiografia oficial, a última, lato sensu, pode mesmo ter antecedido a primeira.

Abstract

In Freemasonry, the ars memoriae has long been hidden amid rituals, sometimes between the lines of the Liberal Arts, sometimes among the Cardinal Virtues. However, its importance may be even greater if it explains the transition from the Operational to the Speculative Phase, a hypothesis put forward by Frances A. Yates. By following this path, this analytical-critical study, based on literature, brings an unusual hypothesis: the Operative and Speculative Phases may have been concomitant or, with greater speculative boldness, based on official historiography, the latter, lato sensu, may even have preceded the former.

Introdução

Primeiramente, cabe esclarecer que este texto passa ao largo das incontáveis técnicas contemporâneas que têm por objetivo facilitar e aumentar a acumulação e a recuperação de uma grande gama de informações. No que tange a esse aspecto ele se atém ao resgate da ideia da configuração básica do que é referido por “memória clássica” ou “memória artificial”, isto é: o recurso às técnicas associativas elementares que permitem passar de um ponto de partida (p. ex., da cor branca), a um intermediário (a neve) até o objetivo final: a lembrança das condições climáticas vigentes em determinado espaço-tempo: o frio congelante. Em contraponto à memória artificial, a memória natural é espontânea, de regra não quer a elaboração de mecanismos associativos, como é o caso da lembrança da refeição mais recente, de alguém recentemente encontrado ou do passeio no final de semana. E sem prejuízo à importância das técnicas, elas não correspondem ao essencial, ainda que uma sessão (maçônica) nas quais as falas sejam memorizadas, como em uma representação teatral, não apenas se revele mais elegante como, sobretudo, favoreça o direcionamento do foco para o que realmente deve merecer a atenção dos Irmãos: os ensinamentos velados por símbolos e alegorias, notadamente por ocasião das sessões Iniciáticas1. Perde-se muito, quase todo o significado ínsito às sessões se a leitura é fragmentada, continuamente interrompida (quando não em meio a rumores e barulhos diversos) à procura do trecho a ser lido, o que também leva à perda da entonação - sim, pois se a Iniciação é também uma dramatização, o entendimento (do enredo) torna-se deveras enriquecido quando os Irmãos representam tal como atores que memorizam as falas. Também por isso, vários textos sagrados, a exemplo do Alcorão, devem(riam) ser recitados e cantados ao invés de simplesmente lidos. Nessa linha, as Lojas de Demonstração, uma tradição inglesa que se adotada no Brasil2, ainda que com adaptações, teria muito a contribuir:

O acesso para membro da Loja era concedido apenas a Irmãos de reconhecida habilidade ritualística e amplo domínio da língua inglesa. Os cargos eram distribuídos para Irmãos que posteriormente iriam servir em suas Lojas de origem, servindo de referência em matéria de desempenho ritualístico, com cerimônias feitas inteiramente de cor3.

É de se perguntar: quanto os expectadores estariam dispostos a pagar para assistir a uma representação teatral em meio a qual inesperadamente os atores a qualquer e a todo momento interrompessem para ler a fala do personagem? E qual seria a reação se, após pagar, tivessem se defrontado com a representação nos termos apresentados? Provavelmente se evadiriam do local antes do término e, com ânimos exaltados, reclamariam a devolução dos valores. Cabe arguir: a Maçonaria, que se apresenta como uma Escola Iniciática, não pode ser comparada com uma representação teatral. Sim, mas a analogia deixa clara a mensagem, senão por outros motivos, porque na Ordem tudo é símbolo dotado de significado, inclusive a virtuose performativa.

Visto o que o texto não aborda, mas sem menosprezar a importância do que exclui, veja-se, então, o que considera.

De hábito a memória não é tema de estudo da Maçonaria, são raras as referências; não obstante deveria sê-lo pois, como se demonstrará, encontra-se amalgamada com outros temas usualmente estudados, como é o caso das Sete Artes Liberais. Surpresa maior, como também se trará à luz, é saber que ela – a Arte da Memória - deu azo ao surgimento do que para alguns seria o primeiro Rito da Era Moderna, o que estabelece a ponte entre fase Operativa e a Especulativa. Portanto, o objetivo principal deste texto é desvelar o papel da memória no seio da Maçonaria, situando-a naquele que deveria ser o seu devido lugar: no centro do palco e sob a luz dos refletores. Assim, devidamente iluminada, talvez os maçons tenham mais claro as perdas acumuladas em razão do esquecimento a que foi relegada, e tendo-a esquecido, em certa medida também perderam os vínculos com os fundamentos e os propósitos da Ordem, bem como fragilizaram os elos que mantêm unidas tanto as partes (atos) de uma sessão Ordinária, quanto estas com as Magnas de Iniciação e as para a progressão de graus. Destarte, a análise crítica focada nas raízes do passado traz à pauta e coloca em xeque as amnésias atualmente responsáveis pelas dificuldades de muitos, exceto dos românticos e dos saudosistas, em encontrar sentido na Maçonaria que, então, se confunde com mais um Clube de Amigos e rede de relacionamentos para os mais diversos fins.

Antecedentes

Hoje parecem claros e até evidentes para os que se dedicam mais a fundo aos estudos sobre a Ordem, os vínculos entre a Maçonaria e a Memória, o que tende a crescentemente fazer desta um objeto de estudo da primeira. Mas nem sempre foi assim, e uma das pioneiras nessa identificação foi Frances A. Yates, 28.11.1899 - 29.09.1981, historiadora inglesa que se concentrou no estudo do Renascimento; e desde então as suas obras, dentre as quais ora se destacam Giordano Bruno e a Tradição Hermética4, El Iluminismo Rosacruz5 e A Arte da Memória6, têm inspirado estudiosos de várias Ordens discretas, a exemplo da Maçonaria, ou secretas. Em A Arte da Memória, inclusive, ela levanta hipóteses de estudo para explicar acontecimentos ainda obscuros no seio da Maçonaria, como é o caso da passagem da Fase Operativa à Especulativa.

A propósito, memória remete à Mnemósine, uma das titânides da hierogamia que deu origem ao panteão grego.

A palavra grega prende-se ao verbo mimnéskein, que significa “lembrar-se de”. A titânida Mnemósine, assim, vem a configurar no universo mitológico grego a própria personificação da Memória. Mas o mito nos diz mais [...] Para celebrar, Zeus une-se durante nove noites consecutivas à Mnemósine, e desta união nascem nove filhas, as cantoras divinas que tinham por função primeira presidir as diversas formas do pensamento: sabedoria, eloquência, persuasão, história, matemática, astronomia. São as nove Musas e a palavra grega que as designa [...] talvez se relacione a um termo que significaria “fixar o espírito sobre uma ideia, uma arte”7.

Essa breve reminiscência histórica-mítica tem por objetivo, de pronto, chamar a atenção para a importância da memória no cotidiano da ancestralidade humana, quando não só ocupava um lugar entre os deuses, como foi a sua prole que, tal como um elo, uniu e deu continuidade geracional entre os deuses da primeira (os gigantes titãs) e os da segunda geração (os deuses olímpicos). Como que a ratificar essa importância, as palavras iniciais de um dos primeiros clássicos da literatura, Teogonia: “Elevemos o nosso canto às Musas [...]”8. Ademais, não é à toa que Sócrates, mas também Platão, viam com receio a iniciativa de registrar as ideias por escrito – porque as pessoas deixariam de estimular a memória, raciocinar, entender e promover o parto de novos conhecimentos. Por isso o primeiro não deixou escritos (e não, como afirmado por alguns, porque não soubesse escrever) e, do segundo, se diz que o essencial do seu pensamento só foi transmitido oralmente aos seus discípulos e encontra-se, para os olhos que sabem enxergar, escamoteado em meio às entrelinhas da sua vasta obra. Ambos, Sócrates e Platão, são largamente utilizados na Maçonaria.

Foi nesse ambiente que Aristóteles (384-322 a.C.) se desenvolveu. Na sua Teoria do Conhecimento o autor estabelece que as percepções após serem apreendidas pelos sentidos são processadas pela imaginação e então memorizadas na forma de imagens, efetivas matérias-primas para os pensamentos subsequentes. É de notar que a realidade pode, então, se confundir (e se confunde mesmo) com as percepções individuais. “Assim, apesar de todo o conhecimento derivar, em última instância, das impressões sensoriais, não é a partir destas em estado bruto que o pensamento funciona, mas após tais impressões terem sido tratadas pela faculdade da imaginação ou absorvidas por ela”9. Por exemplo, quando pensamos e conversamos sobre maçãs, raramente cogitamos e especificamos o tamanho, a cor, o aroma, etc., e tampouco conhecemos, mas valemo-nos das imagens registradas nas memórias-produtos das experiências sensoriais então constituídas na forma de percepções individuais.

Por oportuno, ainda que pareça evidente, é importante chamar a atenção para o fato de que, por inúmeros motivos, dificilmente duas pessoas captam, da mesma realidade, registros idênticos, por vezes sequer semelhantes. E para comprová-lo é suficiente, por exemplo, pensar na imagem (que pode ser a de uma maçã) formada por um daltônico, ou ainda por alguém com alguma limitação olfativa ou táctil. Destarte, até mesmo o diálogo e o entendimento sobre maçãs pode enfrentar obstáculos inusitados; imagine-se, então, se sobre temas abstratos, carregados de subjetividade e vistos por lentes mediadas por sistemas de crenças e ideologias, como é habitual na Maçonaria. Tome-se, por exemplo, os debates sobre o que é e se, afinal, existem ou não verdades (para alguns, Verdade), acerca das chamadas questões fundamentais (de onde viemos, para aonde vamos e qual o sentido da vida?), da formação dos princípios e da escala de valores que medeiam (ou deveriam mediar) as relações humanas, sobre os vícios e as virtudes, da liberdade, etc. que, idealmente, deveriam ser levados “às últimas consequências” conceituais e práticas. O exemplo da maçã é um dos mais simples, mas imagine-se um mundo no qual as memórias (sociais, políticas, históricas, etc.) a todo momento são criadas e recriadas não mais a partir da realidade efetivamente apreendida pelos sentidos, mas a partir de fake News (agora alavancadas pelas ferramentas de Inteligência Artificial) coordenadas a partir de um Ministério da Verdade10. Se à época (pós-II Guerra) o mundo orwelliano era uma distopia, hoje já há vasta literatura, a exemplo de Derosa11, Tucker12 e outros que a partir das atuais condições tecnológicas aventam desdobramentos perturbadores ao tema em foco: Maçonaria e Memória, senão por outros motivos, porque a primeira sobremodo dialoga com a realidade a partir da exploração de símbolos, alegorias, lendas e outros. Se no passado os símbolos eram predominantemente utilizados para superar as insuficiências da linguagem para expressar uma realidade incognoscível em si mesma e duradoura (quiçá eterna), hoje os símbolos também são utilizados para constituir e imediatamente reconstituir realidades instantâneas.

Destaca-se, pois, não só a relevância da apreensão pelos sentidos como as suas consequências quando promovida de forma limitada, distorcida ou equivocada (inadvertida ou maliciosamente): o pensamento e a cognição ficarão comprometidos, podendo-se mesmo criar “falsas realidades”. Claro que, hoje13, sabe-se que não é apenas pelos sentidos que adquirimos o conhecimento, mas explorar este domínio fugiria ao escopo ora pretendido e tampouco faz demasiada falta aos objetivos deste ensaio.

Ademais e paralelamente, o florescimento da democracia grega coloca em destaque uma habilidade: a retórica (uma das Artes Liberais), pois

[...] a verdade é que a arte retórica, mormente dentro do painel de estudos do Trivium, tem como metas prover o aluno com os instrumentos para atuar no mundo labiríntico das opiniões - principalmente das opiniões políticas e do direito;
[...] dois sentidos para a palavra. Retórica pode significar a faculdade natural de procurar argumentos em favor de uma tese qualquer; ou, então, a arte extremamente refinada que foi engendrada pra facilitar o alcance desse fim. Isto é dizer que, já por natureza, tendemos a sair à cata de argumentos que embasem nossas crenças e que possam servir para convencer nossos interlocutores; ao passo que a arte vem corroborar e racionalizar essa atividade humana. Junto com essa atividade, porém, há inevitavelmente misturado o perigo da desvirtuação14.

Portanto, a memória subjaz tanto à cognição que é própria e inerente à natureza humana, quanto se revela indispensável ao sucesso, e antes mesmo à sobrevivência, em um ambiente no qual continuamente se faz necessário convencer terceiros, seja para o engajamento em projetos pessoais (de relacionamentos à empreendimentos idealizados), profissionais ou políticos (conquista do voto).

Não faltavam, pois, motivos para os gregos se ocuparem com a memória: como memorizar, guardar e recuperar as percepções quando necessário? Como assegurar a fidedignidade e a veracidade das percepções? Como memorizar a vasta gama de informações necessárias à argumentação, seja para fins jurídicos ou políticos, ou mesmo para fins expositivos e didáticos?

Os interessados na evolução do estudo da memória poderão recorrer ao “A Arte da Memória”, já considerado um clássico, um efetivo handbook, fonte inspiradora deste texto e do qual foram extraídos os conteúdos básicos à sua elaboração, como bem o demonstram as seguintes citações:

Ninguém conseguiu explicar como essas guildas “operativas” transformaram-se em uma maçonaria “especulativa” e no uso simbólico do repertório figurativo arquitetônico no ritual maçônico;
Penso que a resposta para esse problema possa vir da história da arte da memória. A memória oculta do Renascimento [...] pode ser a verdadeira fonte de um movimento hermético e místico que não utilizava a arquitetura real da maçonaria “operativa” como veículo de seus ensinamentos, mas sim a arquitetura imaginária ou “especulativa” da arte da memória. Um exame minucioso do simbolismo das irmandades rosa-cruz e da franco-maçonaria podem, talvez, confirmar esta hipótese15.

Na mesma linha de Yates, que formou efetivos adeptos, segue Prinke16:

Um dos ofícios medievais mais avançados tecnologicamente era o dos pedreiros, construtores de castelos e catedrais góticas. E um dos desenvolvimentos socioculturais mais misteriosos no início da Europa moderna foi a transformação, durante os séculos XVI e XVII, das guildas de pedreiros medievais em um movimento intelectual conhecido como maçonaria. Não há praticamente nenhuma fonte documentando a passagem de “lojas operativas”, cujos membros eram genuínos artesãos, para “lojas especulativas” onde as tradições da arte da construção permaneciam apenas nos aspectos ritual e simbólico, enquanto os membros eram recrutados principalmente entre cavalheiros e cidadãos ricos. As poucas fontes que sobrevivem são enigmáticas o suficiente para tornar a reconstrução do processo impossível além de hipóteses mais ou menos plausíveis.

Outro que seguiu a “hipótese Yates” foi Cooper17:

Não só o Templo de Salomão era a mais velha construção em pedra da Bíblia, e, portanto, era edificado pelos predecessores no ofício dos pedreiros; a arte hermética da memória oferecia um meio pelo qual poderiam buscar melhorar suas habilidades mentais e suas vidas morais e espirituais. Esse meio ligava a arte da memória com a sabedoria particular dos pedreiros e os fazia especiais e únicos em um aspecto compartilhado por nenhum outro ofício ou negócio. Uma vez que o ritual e todas as palavras associadas e os signos do conhecimento esotérico eram dessa maneira enviados à memória e, então, passados para cada geração seguinte dessa mesma maneira, as partes do cerimonial se tornaram fixas, assim como a sua relativa importância de uma geração para a outra. O construto do Templo do Rei Salomão tornou-se absolutamente central para tudo que a Loja fazia, e isso, eu sugiro, fica claro a partir de seu lugar nos rituais iniciais.

Assim, de Prinke e Cooper, pode se dizer que seguem o que ora se denomina de “hipótese Yates”, qual seja: a de que a passagem da Fase Operativa à Especulativa, de algum modo, posto que ainda é questão em aberto à pesquisa, está relacionada ao desenvolvimento da arte da memória e, como adiante ficará mais claro, não se pode descartar a existência de impactos recíprocos. A esses, como será visto, outros estudiosos já se reuniram e é de se esperar que outros mais venham aportar novos desenvolvimentos, dando então origem ao que se pode denominar de “Escola18 Yates de Maçonaria” – o estudo da Maçonaria (doutrina, ritualística, simbologia, etc.) ao abrigo do manto do estudo da ars memoriae.

Contudo, se de um lado Cooper aderiu à “hipótese Yates”, de outro ele deixa claro que o tema ainda é um campo aberto a estudos mais aprofundados. Com efeito, há sinais que o indicam; assim, salvo melhor juízo, há na citação anterior, senão um equívoco cronológico, um vazio que necessita ser preenchido e melhor esclarecido, pelo que também se constitui como um dos propósitos deste texto e igualmente um convite aberto ao debate no seio da comunidade maçônica brasileira.

A falta de maior dedicação ao tema - Maçonaria & Memória, “hipótese Yates” - explica porque os estudiosos passam ao largo de reflexões que poderiam19 implicar na inversão tanto quanto à gênese da Maçonaria Especulativa quanto os seus desdobramentos, que então seriam vistos como consequências lógicas até chegar aos atuais usos e costumes na e da Ordem. Assim, na ausência de estudos mais aprofundados sobre a “hipótese Yates”, o ingresso dos “Aceitos”20 teria ocorrido porque a Ordem, em decadência, necessitava de patronos e protetores; porque à época (a Maçonaria) era modismo e seguia os passos do movimento rosa-cruz; bem como, em razão do sigilo que as envolvia, o ambiente das Lojas constituía um espaço favorável à conspiração (política) e ao exercício de práticas esotéricas (teúrgicas), entre outras sem perder de vista que as explicações (hipóteses) não necessariamente são mutuamente exclusivas. E se não há consenso, devido às disputas entre a maçonaria inglesa e a escocesa de que o Mason Word foi o primeiro Rito21 (Jones22; Coil23) da Era Moderna oficial (pós-1717), as suas digitais genéticas podem ser encontradas nos Ritos que o sucederam, a exemplo do chamado Rito Moderno (ou Francês); todavia, o que ora importa ressaltar é o trabalho de Mata24, pesquisador espanhol que sublinha o papel da ars memoriae no curso do surgimento do Mason Word, ideia também acolhida Stevenson25.

Segue-se a esses prolegômenos: primeiro, um esforço no sentido a melhor esclarecer os vínculos sugeridos por Yates, endossados por Cooper e outros; para, na seção subsequente, muito brevemente, porque já amplamente discutidos na literatura, trazer à tona os demais elos que vinculam a Maçonaria à Memória, a começar pelo uso de símbolos, mas também As Artes Liberais e as Virtudes, notadamente as virtudes cardeais.

Memória: da arquitetura operativa à especulativa ou vice-versa?

Apesar de as referências preliminares terem situado as preocupações com a memória nos tempos da Grécia Antiga, é fato que aquelas antecedem, e em muito, a própria História da humanidade, pois não fosse a presa (nossos ancestrais) reter na memória os odores, sons e demais sinais do predador - deflagradores das clássicas reações “fugir ou lutar” -, ainda estaríamos na pré-História. Mais “recentemente”, mas ainda durante a Antiguidade, ela foi objeto de estudos entre os egípcios e, muito provavelmente, também por outras civilizações.

A crescente urbanização trouxe novas necessidades, entre elas não apenas ampliar o conjunto, mas, sobretudo, atribuir novos significados e melhorar a qualidade dos signos de comunicação, não mais utilizados apenas de forma direta, mas também simbólica e por vezes forçosamente escamoteados em razão das circunstâncias. Assim, por exemplo, a alusão ao panteão grego, mais do que a referência direta aos próprios deuses, frequentemente carrega a mensagem, por vezes subliminar, das virtudes e dos vícios que habitualmente lhes são associados. Igualmente os animais, sobretudo na literatura, têm sido largamente utilizados e com alvo certo: para referir aos vícios, às virtudes, assim como aos comportamentos dos homens públicos (Lúlio26; Orwell27). Por detrás dessa estratégia, inúmeros motivos, entre eles a segurança, o didatismo do imagético-lúdico, bem como a facilitação do emprego da memória mediante o desenvolvimento de mnemotécnicas - associação de ideias.

O ponto de partida:

Simônides28, poeta e também filósofo, é tido como o inventor das regras dessa arte quando, em um banquete, o teto do salão veio abaixo de repente e os parentes das vítimas não puderam reconhecer (os corpos). Ele recriou a ordem em que cada convidado estava sentado à mesa do banquete e recordou seus nomes, que havia guardado na memória. Ele aprendeu, com essa (experiência), que é a ordem que está na base dos preceitos da memória. Esses (preceitos) devem ser considerados em lugares bem iluminados (in locis illustribus), onde devem ser colocadas as imagens das coisas (species rerum)29.

E atendo-se apenas ao estritamente essencial, então desde muito cedo foi percebido que a memorização (de coisas concretas ou abstratas, ideias, palavras, acontecimentos, nomes, etc.) se tornaria facilitada se os elementos constituintes pudessem ser:

  1. organizados em forma de narrativa - uma pequena história (fictícia ou não) na qual todos os elementos (cenário, personagens, etc.) estivessem logicamente vinculados.

Nesses termos, as pessoas com boa capacidade de memória são aquelas que frente às necessidades (fazer uma apresentação, proferir um discurso, prestar um exame, participar de um debate, etc.) conseguem estabelecer as associações convenientes (e eficazes) à luz do contexto e dos quadros de referências pessoais. Alguns exemplos podem auxiliar para o melhor entendimento:

Ainda:

Matteo Ricci, missionário italiano na China do século XVI [...] papel fundamental em apresentar aos chineses o cristianismo e a ciência ocidental [...] O chinês é uma língua difícil. Não existe um alfabeto, mas cerca de 50 mil ideogramas [...] teve que memorizá-los [...] desenvolveu, então, um artifício. Construiu um palácio da memória - uma imagem mental que compreendia uma série de construções, na qual cada palavra era representada por uma determinada imagem, em um lugar específico. O símbolo para “guerra”, por exemplo, eram dois guerreiros em combate, no canto sudeste de um saguão de recepção. No canto nordeste ficava o símbolo para “lucro” - um lavrador com uma foice, prestes a colher a plantação30.

Por certo que para recorrer à estratégia associativa, além das habilidades (capacidade de abstração, imaginação, flexibilidade, criatividade, etc.) para estabelecer as conexões, antes se faz necessário acumular repertórios de conhecimentos necessários à construção dos quadros de referência, vistos então como efetivas plataformas de lançamento.

Mentes habilidosas, mas sobretudo treinadas, são capazes de enquanto percorrem um ambiente memorizar os conteúdos, mesmo detalhes imperceptíveis aos demais, bem como após a apresentação a numerosas pessoas, de recordar os nomes e algumas das suas características (cor do cabelo, vestuário, adornos, etc.). Ao longo do caminho ou das narrativas distribuem gatilhos que acessam na memória os fatos pertinentes aos objetivos. Já alguns recorreram (e ainda recorrem) à arte da memória para outras finalidades, tendo concebido e deixado legados repletos de mensagens (a partir da arquitetura, do mobiliário, das cores, dos utensílios, das disposições, etc.) que somente aos Iniciados é dado apreender os significados; entre outros, vide, por exemplo, Fulcanelli31 e Abrahão32, onde este refere às catedrais góticas como “livros de pedra” cuja leitura, sabe-se, requer alfabetização específica. Assim, há sinais de que desde há tempos a memória e o oculto andam juntos, circunstância também desde há muito explorada pela Maçonaria.

F. Yates, tendo começado pelos gregos e romanos (dentre os quais se destaca o papel de C. T. Cícero), passa em revista histórica a contribuição de numerosos autores (Sto. Agostinho, Tomás de Aquino, Giulio Camillo Delminio, Ramon Llull, Giordano Bruno e tantos outros) que ampliaram e refinaram as estratégias para o armazenamento e a recuperação de informações contidas na memória. Em meio a tantos, a memória ganha novas denominações, interpretações e abordagens: ela é natural e intrínseca a todos seres (inclusive aos animais) ou artificial, isto é, uma arte - atividade a ser desenvolvida e aprimorada? Ela é um atributo individual ou, em parte, apresenta características típicas dos coletivos? Haveria uma memória cósmica? As respostas variam e não pode ser dito que em relação a todos os aspectos são mutuamente exclusivas. Impossível, à época, como fez Platão, e até hoje não adentrar no estudo da memória sem conjecturar as suas relações com a mente, a alma e o espírito, tramando e urdindo o físico e o metafísico, a mitologia, as lendas e as crenças em geral e, o que aos poucos veio se organizando como corpo científico.

Um lugar ímpar coube ao legado de Giulio Camillo: “Em toda a Itália e a França falava-se de seu Teatro [...] Mas o que era exatamente? Um teatro de madeira, coberto de imagens, como Camillo o apresentou, pessoalmente, em Veneza [...]33. E dele, Viglius Zuichemus (apud Yates34) afirmou para Erasmo:

Dizem que esse homem construiu um certo anfiteatro, uma obra de habilidade maravilhosa; lá qualquer um que vá como espectador será capaz de discursar sobre qualquer tema, com a fluência de Cícero [...] Certas ordenações ou categorias de figuras são dispostas [...] com minuciosidade e habilidades divinas.

Para o leitor melhor entender a alusão ao “espectador” é esclarecido que

[...] o Teatro de Camillo inverte a função normal do teatro: não há público sentado nos lugares assistindo a uma peça no palco. O “espectador” solitário do Teatro fica no lugar onde deveria estar o palco e olha em direção ao auditorium, contemplando as imagens nos portões - sete multiplicado por sete - dispostas nos sete graus ascendentes35.

Para maior compreensão e detalhes a partir de uma leitura amplamente ilustrada sobre “o teatro”, vide Almeida36.

E em La Rocca37 pode ser lido que R. Fludd, estudioso que sucedeu G. Camillo, deu um passo à frente no reconhecimento das características universais e sistêmicas do processo então em desenvolvimento, daí a denominação - Teatro Sistema da Memória:

[...] o Teatro - que é na verdade para Fludd um palco, representa o próprio “espaço-lugar da memória” de armazenagem de conteúdos. Ainda, esse teatro-sistema de Fludd constitui uma estrutura universal de armazenagem de conteúdos inscritos como códigos: não existe um teatro específico, o sistema-teatro de Fludd é um modelo universal;
[...] o espaço é sem dúvida o princípio de organização do “Teatro Sistema da Memória”, um verdadeiro sistema-organização [...] o palco do “Teatro Sistema da Memória” de Fludd se apresenta como o lócus concebido sistema que organiza, em uma rede de inter-relações e interconexões não lineares, a combinação de conteúdos, a partir de signos e significados a eles relacionados-incorporados de uma tradição mágico-hermético-cabalista renascentista.

Ou seja, o “teatro” é um espaço esquadrinhado com latitudes e longitudes - coordenadas - por entre as quais o espectador (lato sensu) distribui à sua ordem mental os pontos de referência (imagens, objetos em geral, palavras, sinais, etc.) que, reunidos e associados, possibilitam construir uma narrativa, tanto para o presente, quando ele (o espectador, o palestrante, etc.) colhe as vantagens da memorização facilitada, quanto para a posteridade, quando ele (um arquiteto, um pintor, um desenhista) deixa então sinais para serem apreendidos pelos que compartilharem do mesmo repertório de signos.

De acordo com Stevenson38: “[...] a Loja maçônica do século XVII talvez fosse, em certo sentido, um templo da memória, um edifício imaginário com lugares e imagens nele colocados como estímulos para memorizar os segredos da Palavra do Maçom e os rituais de iniciação”. Nesses termos, entre tantos Quadros, Painéis e Tapetes, a imagem da Figura 1, tão frequente nos textos maçônicos, adquire, então, uma nova perspectiva durante e após a cerimônia de Iniciação:

Figura 1 - Iniciação à Maçonaria (gravura do séc. XVIII)39

https://bibliot3ca.files.wordpress.com/2019/05/0000-mnemo5.jpg

Uma analogia ressalta a atualidade e a importância do “teatro” visto como um espaço esquadrinhado: trata-se de procedimento semelhante ao habitualmente utilizado pelos arqueólogos, entre outros pesquisadores (biólogos, botânicos, etc.) para acompanhar a evolução de determinados fenômenos, bem como para mapear os achados de pesquisa, e também por peritos e investigadores que, assim, põem ordem ao caos, organizam o quebra-cabeças dando-lhe o sentido e, por vezes, pela via da cronologia dos fatos criam narrativas concatenadas que corroboram ou abrem novas e por vezes inusitadas perspectivas de estudos e interpretações. Ao leitor Iniciado não escapa a associação com o lema Ordo ab Chao, tão usual na Maçonaria - vide, entre tantos, Ismail40.

Ora, ao invés de estar situado no palco de um teatro olhando para a plateia, imagine-se frente à uma catedral, ou adentrando a um templo ... eventualmente, o Templo de Salomão, uma Loja Maçônica. Em Anderson41 pode ser lido:

Quando estava tentando lembrar algo, o praticante caminharia mentalmente pelo prédio. Quando ele chegasse, por exemplo, a uma certa estátua, ele lembrar-se-ia da imagem que ele lhe tinha associado, por exemplo, uma espada e um escudo, e isso lembraria o que desejava lembrar, que o próximo ponto do seu discurso envolvia guerra. Idealmente, as imagens deveriam ser impressionantes e memoráveis [...] O elemento-chave deste sistema é o uso de imagens mentais em configurações ordenadas, muitas vezes arquitectónicas, e tornou-se a base para desenvolvimentos posteriores.

Esse é, pois, o nexo standard, aceito como default, encontrado e explorado quase que na totalidade da literatura: os Templos (Lojas) seriam então, como disse Abrahão42, Livros de Pedra repletos de mensagens, algumas, talvez muitas, deixadas à posteridade, ... ocultas? E considerando que a Maçonaria, enquanto construção social é um corpo multifacetado e dinâmico em meio ao qual se mesclam, sem que se possa claramente distinguir as idiossincrasias dos “pais fundadores”, nem entre os Operativos e menos ainda entre os Especulativos, não é possível descartar o nexo enquanto possibilidade que, antes e além de tudo, é lógica, até imediata. Contudo, essa, conforme adiante será visto, não se confunde, na íntegra, com a “hipótese Yates”.

Embora o marco de referência histórica para o surgimento da Maçonaria Especulativa seja o evento de 1717, não pode ser perdido de vista,

Estão, pois, estabelecidas as considerações iniciais que permitem fazer um debate mais aprofundado acerca de uma das questões já levantadas: a “hipótese Yates” da existência de uma lacuna explicativa da passagem da fase Operativa à Especulativa. Para maior facilidade do entendimento, pela via da aproximação, ora são resgatadas duas dentre as citações anteriores: a primeira, de Yates46; a segunda, de Cooper47, bem como, agora e sobre as quais são destacados alguns trechos:

Penso que a resposta para esse problema [a passagem da maçonaria operativa à especulativa] possa vir da história da arte da memória. A memória oculta do Renascimento [...] pode ser a verdadeira fonte de um movimento hermético e místico que não utilizava a arquitetura real da maçonaria “operativa” como veículo de seus ensinamentos, mas sim a arquitetura imaginária ou “especulativa” da arte da memória. Um exame minucioso do simbolismo das irmandades rosa-cruz e da franco-maçonaria podem, talvez, confirmar esta hipótese;
Não só o Templo de Salomão era a mais velha construção em pedra da Bíblia, e, portanto, era edificado pelos predecessores no ofício dos pedreiros; a arte hermética da memória oferecia um meio pelo qual poderiam buscar melhorar suas habilidades mentais e suas vidas morais e espirituais. Esse meio ligava a arte da memória com a sabedoria particular dos pedreiros e os fazia especiais e únicos em um aspecto compartilhado por nenhum outro ofício ou negócio. Uma vez que o ritual e todas as palavras associadas e os signos do conhecimento esotérico eram dessa maneira enviados à memória e, então, passados para cada geração seguinte dessa mesma maneira, as partes do cerimonial se tornaram fixas, assim como a sua relativa importância de uma geração para a outra. O construto do Templo do Rei Salomão tornou-se absolutamente central para tudo que a Loja fazia, e isso, eu sugiro, fica claro a partir de seu lugar nos rituais iniciais.

Muito embora 1717 seja um marco para a Maçonaria, assim como 1789 o é para a Revolução Francesa, enquanto processo histórico a passagem da Fase Operativa à Especulativa foi gradual, tendo antecedido em mais de um século o surgimento da Grande Loja da Inglaterra. Ademais, a Lenda de Hiram e com ela o substrato arquitetônico do imaginário simbólico da Maçonaria surgida na Era Moderna, denominada Especulativa - o Templo de Salomão -, só foram introduzidos a partir dos anos 20 do séc. XVIII; até então, e ainda por durante muito tempo as confrarias (por falta de recursos, lideranças, etc.) se reuniriam em tabernas, clubes, igrejas ou qualquer outro espaço, como é o caso das Lojas itinerantes que até hoje reúnem militares em trânsito. Exemplo de antecedência sempre mencionado é o da Loja Mary´s Chapel (também citada como Loja de Edinburgh), reconhecida, na versão escocesa, como a Loja mais antiga (Adrião48; Coil49).

Assim, considerando que os Templos que atualmente se confundem com as próprias Lojas50 foram inovações introduzidas somente a partir do último quarto do século, mais precisamente em 1776 (Castellani51), é provável que a atividade especulativa referida por Yates – cujo foco de estudo é Renascença - não guarde relação direta com os desenvolvimentos e as introduções pós-1717, como é o caso da Lenda do Terceiro Grau combinada à arquitetura do Templo, mas antes à sua percepção de que os Templos se revelavam como um espaço ideal (à semelhança de um teatro) para o exercício e o desenvolvimento da arte da memória. Lembrando que o Renascimento se estendeu até o séc. XVII, período de registro dos primeiros Aceitos, Yates inferiu que a arte da memória estaria muito mais próxima das atividades típicas da Fase Especulativa, alavancada pelos Aceitos, do que das atividades dos maçons operativos. E em razão dessa afinidade, que também se revela extremamente útil à nova práxis, a própria arte da memória teria contribuído para a consolidação da passagem Operativa-Especulativa.

Como existem muitas lacunas nos estudos relativos à introdução da Lenda e do Templo no corpus maçônico, notadamente no que tange ao planejamento e à intencionalidade estratégia, e à luz dos fatos e da cronologia acima, cujo desconhecimento por Cooper não é razoável admitir, a fala do autor só pode ser entendida em sentido mais amplo, talvez devida à larga tradição judaico-cristã em meio a qual a realidade e a ficção se misturam e mesmo confundem na forma de lendas, mitos e símbolos que desde há séculos permeavam as reuniões tipo “A” e “B”. Segundo esse entendimento, a importância que Cooper atribui ao Templo peca pelo anacronismo.

Para o melhor entendimento da “hipótese Yates” é preciso lembrar que ao lado da racionalidade e da objetividade científica, que por constituírem a própria gênese da Modernidade52 são sempre citadas, ocorreu, também nos séculos XV/XVI, um segundo Renascimento, o qual, por analogia ora se denomina Renascimento Místico - um dos componentes do humanismo que também identifica o período. Embora sejam fenômenos paralelos, quando citados, por opção (foco temático, estratégia ou crenças) do autor, em geral um tende a ofuscar o outro, e na maioria das vezes o destaque é conferido ao racionalismo que viria a atingir o ápice durante o Iluminismo. Ademais, chama a atenção que entre os estudiosos brasileiros esse assunto (a simultaneidade dos “Renascimentos”), de regra, seja deixado à margem, sobretudo pelos Iniciados comprometidos com o Iluminismo quando delineiam o contexto histórico da passagem da Fase Operativa à Especulativa, o que se constituiu em motivação adicional para a elaboração deste ensaio com notas ainda preliminares. Já a literatura internacional, conforme aos poucos se dará a conhecer, é mais rica; Stevenson53, por exemplo, um não-Iniciado, é um dos que além de trabalhar com a “hipótese Yates” reconhece a importância do renascimento místico. Também Yates54, pedra angular deste estudo no que tange à ars memoriae, reconheceu a densidade do pensamento místico na Maçonaria, o que se depreende a partir da sua pergunta e resposta:

Onde mais existe igual combinação de tolerância religiosa, vinculada emocionalmente ao passado medieval, com uma ênfase nas boas obras, além de um imaginativo apego à religião e ao simbolismo egípcio? A mim ocorre uma única resposta: na maçonaria, herdeira da ligação mítica com os maçons medievais e com a sua tolerância, sua filosofia e seu simbolismo egípcio.

O renascimento do pensamento místico (mágico) e nas crenças em geral deu-se, sobretudo, a partir da tradução, realizada por M. Ficino (séc. XV), das obras de Hermes (Mercúrio) Trismegisto55. Yates56 (1990, p. 37-8) esclarece os motivos:

Ficino, em seu comentário sobre o tratado, mostra-se imensamente impressionado pelas notáveis semelhanças entre este livro e o Gênese [...] Ele viu a criação surgir graças à Palavra Divina e o homem ser criado segundo imagem de Deus e, depois, sua queda da esfera inteligível para o corpo [...] Depois, ele nos instrui sobre como podemos novamente nos elevar para aquela natureza inteligível e imortal de onde degeneramos [...] o que impressionou Ficino foi, acima de tudo, aquilo que lhe pareceu semelhante a Moisés na sua obra.

G. Pico della Mirandola (1463-1494), J. Boehme (1575-1624) e E. Swedenborg (1688-1772), entre tantos outros serão sensibilizados por essas ideias que, por sua vez, terão grande influência e ascendência intelectual sobre os ideólogos dos mais diferentes Ritos e Rituais que povoarão a Maçonaria em transformação e expansão – como visto, de Operativa à Especulativa, da Ilha para o Continente e deste para Além Mares, onde estes últimos não são apenas referências geográficas, mas antes imagens das dimensões da emergência de um novo ator com relevante atuação nos domínios políticos, sociais e religiosos.

G. Galilei, J. Kepler e I. Newton, apenas para citar aqueles que são notoriamente reconhecidos como “homens de ciência”, eram também homens presos aos dogmas das Escrituras, religiosos, portanto, também “homens de fé”; entre tantos, Gleiser57 sublinha:

Mas, para Kepler, o Sol era muito mais do que isso: ele era o trono de Deus, Seu poder permeando o sistema solar. O sistema de Kepler não era apenas heliocêntrico; ele era também teocêntrico. Como notou Holton, o Sol tinha três papéis complementares no Universo de Kepler: o de centro matemático das órbitas planetárias, o de centro físico, garantindo a continuidade dos movimentos orbitais, e o de centro metafísico, o templo da Divindade;
As ações de Galileu tornaram a igreja que ele tanto desejava servir numa inimiga, contra suas ideias e contra seus discípulos;
Newton via o Universo como manifestação do poder infinito de Deus. Não é exagero dizer que sua vida foi uma longa busca de Deus, uma longa busca de uma comunhão com a Inteligência divina, que Newton acreditava dotar o Universo com sua beleza e ordem; e,
[...] vou abraçar a verdadeira religião de Cristo com toda a minha alma [...] e irei ou fazer da teologia o meu objeto principal de estudo, tornando-me membro do clero quando o tempo prescrito por esses estatutos chegar, ou renunciar a minha posição no College.

Como se nota, aqueles que hoje são reconhecidos como “gigantes da ciência”, os arquitetos da Modernidade Científica, também foram místicos e praticantes das chamadas “ciências ocultas” (a exemplo da alquimia e da astrologia), como de sorte o foram vários integrantes da The Royal Society (à época o mais significativo Templo da Ciência), o que lhes trouxe não só angústias pessoais, familiares e profissionais, como também efetivos dilemas na medida em que o avanço das suas investigações deixava à evidência as lacunas, as inconsistências ou quiçá as incorreções nas Escrituras (Gleiser58; Fanning59).

A proximidade entre esses dois grandes domínios – a ciência e o ocultismo60 -, assim como os laços com a maçonaria podem ser vistos a partir da seguinte observação de Prinke61:

Sir Robert Moray (1609-1673, iniciado em 1641) e Elias Ashmole (1617-1692, iniciado em 1646), também foram os membros fundadores da Royal Society em 1661, e o primeiro foi seu primeiro presidente. Ao mesmo tempo, ambos eram, assim como alguns outros membros iniciais, muito interessados em alquimia, astrologia e hermetismo renascentista.

Hanegraaff (apud Derosa62) ratifica: “[...] divorciada do catolicismo devido o seu espírito revolucionário, a ciência moderna foi construída sob bases esotéricas e místicas, como mostra a história pessoal de nomes como Isaac Newton, René Descartes, Francis Bacon e outros”. Em que pese a afirmação de Lima63 de que “Isaac Newton [foi] provavelmente maçom” não encontrar suporte em outras fontes, não há dúvidas quanto ao seu profundo envolvimento com as ciências herméticas, em especial a alquimia, por mais de 30 anos, bem como do seu relacionamento, na Royal Society, com inúmeros maçons e ocultistas (Fanning64).

Mas mais do que a proximidade, o que se constata é a efetiva superposição por força do Zeitgeist (espírito do tempo) que, se se manifesta em diferentes níveis, também mantém relações cruzadas: de visões de mundo, paradigmas, instituições e indivíduos. Tome-se, mais uma vez, o caso de um dos primeiros maçons especulativos documentalmente reconhecidos:

Elias Ashmole (1617-92) reverenciava John Dee, cujos escritos colecionava e cujos ensino alquímicos e mágicos buscara pôr em prática [...] Em 1652, Ashmole publicou o Theatrum Chemicum Britannicum [...] simpático ao rosacrucianismo [...] Ashmole aspirava a ressuscitar de uma forma nova a alquimia matemático-cabalista de Dee (Fanning65).

Portanto, é preciso observar que ao contrário do que muitos creem, que não havia um movimento exclusivo e hegemônico (o curso inexorável da ciência), mas pelo menos dois e em permanente tensão que, embora da mesma raiz - a curiosidade e a dúvida que levaram à filosofia, à indagação das causas primeiras (ou últimas conforme o ponto de partida) - aos poucos foram mutuamente distanciando-se a ponto mesmo de em determinados campos e momentos serem observadas animosidades, ora veladas, ora mais explícitas. E ainda: se havia dois polos (ciência vs crenças), um deles, à época majoritariamente representado pelo cristianismo católico, estava sob severo ataque e já apresentava fraturas - movimento conhecido como Reforma – que viriam a multiplicar as formas de interpretar as Escrituras.

Estão pois, criadas as condições para melhor verificar a “hipótese Yates”, que captura todas as mudanças em andamento: (1) o duplo Renascimento que, por sua vez leva (2) à ampliação e em certa medida o redirecionamento dos estudos e práticas mnemônicas; (3) à transformação da Maçonaria de Operativa à crescentemente Especulativa; bem como (4) os influxos que esta recebe a partir do resgate do hermetismo e a alavanca proporcionada pelo (res)surgimento da Sociedade Rosacruz - séc. XVII. A sequência de algumas citações de Anderson66 e Prinke67 pavimentam o caminho no sentido aos objetivos:

I) Anderson:

[...] a Maçonaria está ligada ao Rosicrucianismo. Este link tornar-se-á importante, ao considerarmos a arte da memória [...] A Arte da memória, ou ars memorativa, era uma técnica específica para memorizar coisas, bem conhecida na época em que Schaw estava escrevendo, que tinha as suas origens nos tempos Clássicos. Originalmente, a intenção da arte da memória era aumentar grandemente a capacidade natural da memória humana [...] Nos tempos medievais e renascentes tardios, a arte da memória gradualmente tornou-se altamente simbólica. Os neoplatonistas e hermetistas gradualmente a adaptaram para desenvolvê-la numa forma especial de conhecimento, uma maneira especial de se relacionar com o universo;
Nos tempos medievais e renascentistas, juntamente com as configurações arquitectónicas usadas na arte clássica da memória, os praticantes faziam uso de todo o cosmo ptolemaico de esferas concêntricas como cenário para as suas imagens de memória. Hermetistas do Renascimento levaram isto um passo adiante. Eles argumentavam que, se a memória humana podia ser reorganizada à imagem do universo, ela tornou-se um reflexo de todo o reino das Ideias platónicas e, portanto, a chave para o conhecimento universal. O microcosmo da memória reflectiria o macrocosmo do universo. As imagens colocadas num edifício não precisam ser usadas para associar e lembrar ideias externas arbitrárias. As próprias imagens podem ser usadas para lembrar o observador de certas ideias. A ênfase muda de expansão da memória para a busca de uma linguagem universal de símbolos. O templo da memória pode se tornar não apenas um método para lembrar discursos, mas uma ferramenta para ensinar.

Ressaltam, nas citações acima, dois dentre os Sete Princípios Herméticos: 1) “O Princípio do Mentalismo – o todo é mente; o Universo é mental”; e, 2) “O Princípio da Correspondência - assim como no alto, embaixo; assim como embaixo, no alto” (Três Iniciados68). Em síntese, o renascimento neoplatônico-hermetista (re)colocou no centro do palco dos debates a questão da unidade entre o homem (a matéria - o micro) e o cosmos (o espiritual - o macro), bem como a existência de um liame entre os polos e, por conseguinte, um meio (um canal) e uma linguagem para a comunicação entre esses planos. O conjunto, assim constituído, compunha o plano divino, e desvelar este plano, inscrito na natureza, é um dos objetivos fundamentais do homem com o auxílio dos magos que desvelam os segredos, abrem os portais e operam através de talismãs. Em meio a tanto, uma dificuldade: a linguagem divina é simbólica, sendo as palavras insuficientes para revelar os seus planos.

Decorre das colocações de Anderson, a admissão de que a fase Especulativa, ao contrário do senso comum, se não antecedeu, concorreu com fase Operativa. Segundo esse pensamento, os templos foram construções inspiradas no entendimento (à época) existente acerca da ordem cósmica, as edificações correspondiam, antes, a imagens especulares e especulativas com o intuito de explicar e dar um sentido às questões fundamentais que acompanham os homens desde a pré-História: de onde eu vim, para aonde vou e por que estou aqui? Origens, fins e razão de ser da humanidade. Envoltos por esse macroambiente e por vezes favorecidos (quiçá mesmo estimulados) pelo microambiente (os templos) os pedreiros, pela via da fé, ressignificavam os seus instrumentos de trabalho.

A atividade especulativa no seio da Maçonaria não surge, pois, por acaso, aqui e acolá, sem antecedentes e motivações. Essa “nova” linha de pensamento, além de conferir continuidade histórica ao preencher a lacuna observada por Yates, não necessariamente colide com a interpretação clássica, standard, pois pode com ela conviver, eis que a arquitetura (lato sensu) continua como um instrumento ímpar a serviço das mnemotécnicas. Ademais, ao invés de recorrer e acumular interpretações isoladas, quando inverte o sentido histórico, que passa da atividade especulativa à operativa, mas que não impede que desta se promova acréscimos (novas configurações e usos) àquela, abandona as representações particulares e passa a admitir a existência de um quadro sistêmico mais amplo passível de acesso pela memória e, por extensão, de um conhecimento universal e perene. Nesses termos o autor (Anderson) conclui:

Cada Loja é, de facto, um Templo da Memória, projectado para provocar efeitos específicos através da lembrança das suas imagens e símbolos, e os nossos movimentos físicos à medida que avançamos através da loja. Cada grau enfatiza um aspecto deste Templo. A palestra do grau de Aprendiz lembra-nos o nosso lugar no esquema cósmico das coisas, o macrocosmo. O grau de Companheiro traz-nos de volta à terra, enquanto nos movemos através do mundo material. O grau de Mestre Maçom traz a espiral ainda mais para dentro, para dentro de nós, para o microcosmo da psique humana. Assim, a arte da memória continua a ser uma parte essencial da iniciação maçónica. O método da iniciação maçónica é ensinar-nos a construir, e a viver, um templo da memória, um templo repleto de símbolos que nos lembrem daquele edifício espiritual, daquela casa não feita com as mãos, eterna nos céus.

II) Prinke analisa um período posterior e admite mesmo que pode ter havido um retrocesso no desenvolvimento da própria Maçonaria. Se antes, na Fase Operativa as atividades especulativas eram largamente praticadas a partir de larga base de conhecimentos e com o lastro da memória, a emergência e consolidação da Fase Especulativa, em certa medida, promoveram e mecanização das atividades:

As ferramentas dos pedreiros se tornaram idealizadas e seus significados foram explicados de maneira verdadeiramente neoplatônica, muito parecida com a arte hermética da memória. As palestras dadas aos candidatos nas cerimônias de iniciação do século XVIII seguiam uma sequência de símbolos exibidos em um tapete pintado ou prancha de traçar. Curiosamente, o termo latino tractare, da qual deriva a palavra inglesa “traçar”, era usado no escolástico medieval ars memoriae para denotar “coleta” de objetos de memória em locais de memória. Também se pode dizer que a arquitetura e mobiliário de uma Loja Maçônica Moderna servem como um edifício de memória ou teatro de memória, onde objetos são trazidos em pranchas de traçar para facilitar a visualização dos iniciados e explorar o mundo ideal por trás dos símbolos;
Tal abordagem do significado e ritual de maçonaria, com suas raízes na magia hermética neoplatônica e técnicas de visualização cabalística, ainda pode ter sido praticada no século XVII na Inglaterra, quando o auge da Revolução Científica era paralelo a um novo surto de interesse pela alquimia e pelo ocultismo [...] Mas durante o Século XVIII algo aconteceu e o mundo imaginal (para usar o termo de Henri Corbin) dos templos da memória deu lugar à aprendizagem mecânica. Não se esperava mais que os candidatos criassem construções simbólicas para lembrar os ensinamentos e segredos do ofício, mas apenas recitá-los. Essa mudança da memória imaginária baseada em símbolos para a memória literal baseada em texto é mais bem exemplificada pelo surgimento de um novo tipo de auxílio mnemotécnico na virada do século XVIII e XIX que, até onde sei, nunca foram estudados [...] O uso dessas ajudas mnemotécnicas na Maçonaria Americana marcou a mudança da arte de memória tradicional e hermeticamente tingida, com sua base arquitetônica e imagens simbólicas de objetos de memória significando as verdades ideais, para a aprendizagem repetitiva de cadeias de caracteres prescritas que podem ser desprovidas de qualquer significado espiritual [...] Eles não precisam memorizar nem mesmo os textos de seus rituais. Eles se afastaram das próprias raízes do movimento maçônico – se aceitarmos a teoria de Yates [...] sobre o papel que a arte da memória desempenhou nas origens da franco-maçonaria [...] Tudo o que chama a atenção aos olhos mais imediatamente atrai a atenção e imprime na memória verdades sérias e solenes. Os maçons, portanto, adotaram universalmente o plano de inculcar os princípios de sua ordem por meio de figuras típicas e emblemas alegóricos, para evitar que seus mistérios descessem ao alcance familiar de noviços desatentos e despreparados, de quem eles talvez não recebam a devida veneração [...] Imprimir a verdade solene na memória usando emblemas alegóricos é o que a maçonaria era originalmente. Mas na virada dos séculos XVIII e XIX a fraternidade parece ter perdido estas “chaves de Hiram para o Templo de Salomão” e reverteram ao aprendizado mecânico daquilo que se tornou palavras vazias, desprovidas do poder com que Girolamo Cardano e Giordano Bruno pretendiam carregá-las.

Como se percebe, a “hipótese Yates” parece conduzir a uma visão negativa, decrescente quanto ao conteúdo, papel e mesmo relevância histórica da Maçonaria, precisamente o oposto do que, por contraste, ora se denomina como a visão tradicional que os maçons possuem de si mesmos e da própria Ordem; como se da fase Operativa à Especulativa tivesse ocorrido um avanço, quando de fato o contrário teria ocorrido se admitidos os novos quadros de referências inaugurados por Yates e, como visto, já aprofundados por outros estudiosos da Maçonaria.

Prinke e Mata vão além, complementam Cooper e sugerem como foram estabelecidas as pontes que unem a Memória à Maçonaria Especulativa. Assim, em Cooper69 pode ser lido que:

O Segundo Estatuto70, assim como o Primeiro, possui orientações para as Lojas e suas atividades. Uma instrução em particular é bem reveladora:
Que o Vigilante da Loja de Kilwinning, sendo a segunda Loja na Escócia, ponha em teste a arte da memória e da ciência, daqui em diante, de cada Companheiro do Ofício e de cada Aprendiz, de ano em ano, de acordo com as suas vocações; e, no caso de eles não saberem qualquer ponto que deveriam aprender, pagarão penalidades [...] e isso deve ser pago à caixa para o bem comum anualmente [...].

Na sequência, Cooper71 analisa e conjectura acerca do trecho destacado:

Como não haveria sentido em conduzir um teste anual sobre algo de conhecimento comum, esse exame sugere a existência de um corpo compartilhado de conhecimentos especial e sabido apenas pelos pedreiros. Infelizmente o “alguma coisa” a ser memorizada não está especificado [...] Mas por que um teste anual? A resposta deve, em parte, ser por causa de a maioria dos pedreiros ser analfabeta. Se eles soubessem ler e escrever não haveria necessidade de memorizar “alguma coisa” [...] Ao introduzi-lo, ele nos contou algo muito importante: o “alguma coisa” não é apenas uma palavra, um aperto de mão ou um movimento particular [...] Assim, eu argumentaria que Schaw está se referindo às cerimônias secretas dos pedreiros [...];
Embora seja possível que os pedreiros utilizassem a arte da memória antes de Schaw se envolver em suas atividades, é certo que ele formalizou o uso nas Lojas escocesas.

E quais teriam sido as motivações e as fontes de inspiração (conhecimento) que levaram W. Schaw a introduzir a memória no seio da Maçonaria? Ainda de acordo com Cooper72:

Parece que, ao operar em segredo, as Lojas dos pedreiros estavam pondo em segurança um conhecimento especial que era único para elas, protegendo assim sua “propriedade intelectual” da melhor forma que conheciam. Mesmo que os pedreiros não fossem todos analfabetos, muito do seu conhecimento esotérico não teria sido posto em papel para que se mantivesse secreto (na verdade, isso pode ser provado de maneira indireta pela ausência de qualquer evidência escrita de ritual por quase cem anos [...] A arte da memória seria, portanto, bem adequada como ferramenta para manter certo conhecimento em segredo dos não pedreiros e como um apoio eficiente para a sua memorização. Há outra razão73 de por que a arte da memória era particularmente adequada para as atividades dos pedreiros [...].

Vista a motivação, de onde então W. Schaw teria buscado a inspiração para introduzir, a partir do Segundo Estatuto, a exigência de exames pautados na memória? Prinke74, citando Stevenson, estabelece a seguinte conexão:

Alexander Dickson (1558-1604), um cortesão de James VI, publicou um tratado sobre a arte hermética da memória em 1584 e também deu lições particulares sobre sua versão clássica para necessidades puramente práticas. Havia também William Fowler, poeta e secretário da rainha da Escócia, que escreveu um tratado sobre a arte da memória e também a ensinou a James VI. Ambos deviam ter conhecido William Schaw muito bem, especialmente porque ele também era o camareiro da rainha. É, portanto, bastante provável que a arte da memória, tanto em suas versões hermética quanto pragmática, estivesse em moda na corte de Edimburgo, e o interesse do Rei por ela certamente influenciou outros. Quando William Schaw tentou uma reorganização das guildas de pedreiros, ele pode ter reforçado o treinamento naquela arte para o aperfeiçoamento do ofício. A influência de Dickson e o interesse geral em ideias ocultistas e herméticas na corte escocesa provavelmente motivaram Schaw a infundir a nova estrutura de lojas maçônicas com elementos da arte hermética de Bruno e assim iniciar a corrente especulativa da maçonaria. Versões da arte clássica e medieval da memória podem muito bem ter sido usadas pelos pedreiros, bem como outros ofícios, muito antes, embora não haja praticamente nenhuma evidência documentada disso.

Mata75, por sua vez, associa o surgimento do que talvez mais se aproxime de ser o que já foi referido como Rito-mãe da Maçonaria Especulativa pós-1717 à reação aos Estatutos (católicos de W. Shaw) que implicavam na imposição do uso da memória aos maçons calvinistas:

A expressão “Palavra de maçom” (Mason Word) designa em pouco mais de 20 textos escoceses e ingleses do século XVII e em pelo menos uma dúzia de textos britânicos do século XVIII, um rito maçônico que consistia em receber um novo maçom em loja, dando-lhe um aperto de mão enquanto se comunicava o nome das duas colunas (J e B) do Templo de Salomão (I Reis 7,21) [...] é aparentemente com este Rito Escocês, Palavra de Maçom, que em dezembro de 1714, o escocês e pastor presbiteriano James Anderson recebeu como Maçons Aceitos os futuros criadores da Grande Loja de Londres. Este rito escocês estava destinado a ter uma grande posteridade, uma vez que terminou muito rapidamente, devido ao desaparecimento progressivo das antigas lojas operacionais da Inglaterra, por suplantar o antigo rito operacional e anglicano de recepção em Loja prescrito nos Antigos Deveres Medievais (Rito que consistia em receber um novo maçom dando-lhe os Antigos Deveres, um livro sobre o qual, o recipiendário deveria jurar que os respeitaria);
A “Palavra de Maçom” é, sem dúvida, de origem calvinista [...] Se os Maçons calvinistas de Kilwinning [...] desenvolveram por volta de 1628-1637 este Rito especificamente calvinista de recepção em loja, foi porque neste momento eles se reusaram a praticar o antigo rito anglicano [cristão] de recepção em loja prescrito pelos Antigos Deveres [...];
[...] acaba por ser a fonte dos vários ritos maçônicos de hoje praticados no mundo.

Finalmente, Mata76 estabele os vínculos históricos da Palavra de Maçom com o tema central deste texto: a questão da memória.

Não nos cansaremos de lembrar, mais uma vez, que a criação do Mason Word, por volta de 1637, pelos Maçons calvinistas da Loja de Kilwinning, nasceu em resposta à obrigação que impôs Schaw, de praticar uma arte de memória. Esta loja, rejeitando a continuidade da prática do ritual de recepção prescrito pelos Antigos Deveres Anglicanos, opta pela forma de um catecismo simbólico, cujo vocabulário é composto por imagens de acordo com a tradição das artes da memória, mas umas imagens verbais (metáforas, alegorias) devido, em parte, à confissão presbiteriana e outra do caráter iconoclasta característico do Calvinismo que forçou aquela loja a essa substituição da imagem verbal em lugar da imagem plástica.

Como visto, para Yates a passagem da Maçonaria Operativa à Especulativa está inserida no contexto de um processo mais amplo, o do desenvolvimento da ars memoriae. E partir deste contexto é possível observar que ambas, a Maçonaria e a ars memoriae, se encontram a partir de pelo menos dois caminhos: (1) pela via dos usos e costumes que apesar de receberem diversas denominações (místicos, metafísicos, ocultistas, transcendentais, esotéricos, herméticos, etc.) têm em comum a natureza especulativa inata à natureza humana, daí que nos acompanha desde a aurora da humanidade; mas também, (2) a partir do final do medievo como uma reação impregnada de motivações políticas e religiosas à sua imposição (da ars memoriae) em um dos epicentros que disputam a primazia do surgimento da Moderna Maçonaria Especulativa: os maçons calvinistas de Kilwinning. O primeiro caminho deixa claro que “a Maçonaria é um caso particular” em um quadro geral, pois práticas semelhantes eram realizadas por outras Corporações de Ofícios como relatam, entre outros, Gordon77 e Cooper78. O segundo caminho permite dupla e contraditória avaliação: 1) de um lado revela o peso dos acasos históricos (“as pessoas certas, nos locais certos e nos momentos certos”), isto é, não se pode atribuir o mérito quanto à concepção, à deliberação e à execução à determinada pessoa; 2) mas de outro deixa à vista a habilidade (técnica, política, de visão, etc.) de um cortesão que, pelas iniciativas, veio a exercer um papel chave na História da Maçonaria: William Schaw, cuja obra, desde então, ganhou expansão e “aperfeiçoamentos”.

Ora, se aceita como motivadora de pesquisas e daí então corroborada por sucessivos estudos, a “hipótese Yates” traz implicações deveras interessantes: primeiro, senão soluciona, traz novas luzes ao velho problema da origem natural (não formal, oficial) da Maçonaria Especulativa, bem como preenche a lacuna - o período de passagem Operativa-Especulativa, por vezes referido como transição. Ademais, ao promover a inversão da sequência - ao invés de Operativa à Especulativa, vice-versa -, levanta novas e inusitadas discussões com implicações que reverberam no próprio glamour frequentemente associado à Ordem. Por exemplo, a fase Especulativa não poderá mais ser vista (como alguns autores ressaltam) somente como aquela na qual os homens rudes, trabalhadores braçais cederam, no curso de uma trajetória evolutiva, o espaço para os trabalhadores da mente, aos intelectuais e à sua corte aristocrática, seja ela nobre, burguesa ou militar. Fosse absolutamente clara a percepção do avanço, talvez não tivesse havido e enfrentado tantas resistências; mas como toda mudança, não foi um processo pacífico e imune às críticas, conforme revelado por Guerra79:

Concepção que se evidencia no elitismo de seus membros, que em parte era o que mais irritava os membros procedentes das lojas operativas sob a proteção de York, o esnobismo de uma nova associação especulativa de novo cunho incorporado nessa corrente newtoniana que flutuava no seio da Grande Loja de 1717.

Daí que não se pode afirmar, generalizando, ter havido uma evolução, pois para alguns ocorreu mesmo o inverso. Se para determinados grupos a expansão (territorial, número de adeptos, de Lojas, ascendência política, etc.) era vista como sinal de êxito, para outros foi um retrocesso, um distanciamento das tradições, como bem revela o longo embate entre Antigos vs Modernos.

A capacidade de abstrair, comunicar-se mediante a linguagem simbólica, o que corresponde a especular são, ao fim e ao cabo, senão os únicos, como defendem Neves, Rapchan e Blumrich80, os principais fatores que distinguem os sapiens:

Entretanto, a linguagem (falada, gráfica) implica na elaboração, manipulação e circulação de ideias, conhecimento ou informações por meio de abstrações que, aliás, são simultaneamente, precisas e polissêmicas, já que precisa haver um denominador mínimo entre os sujeitos envolvidos [...] em outras palavras, dependem da capacidade simbólica para sua expressão e reprodução. Portanto, sem capacidade simbólica plena, não há reprodução de significado;
Esperamos que a revisão por nós empreendida nas páginas anteriores tenha demonstrado, de maneira inequívoca, que a única diferença realmente qualitativa entre nós, humanos, e os demais seres que habitaram e que habitam o planeta, é nossa capacidade de atribuir significado/sentido aos objetos, aos fatos e à própria vida.

Na sequência, os autores revelam achados de pesquisa que datam a produção de símbolos materiais e imateriais, com propriedade de significado, desde há mais de 50 mil anos; portanto, a atividade especulativa naturalmente antecede ou é concomitante e tão antiga quanto a operativa (sendo a única exigência a existência do próprio homem) porque inerente à nossa ancestralidade.

E o que diz a Maçonaria quanto ao que identifica e caracteriza a atividade especulativa?

A Maçonaria existe sob duas denominações - operativa e especulativa [...] Pela segunda, aprendemos a governar as paixões, agir sobre o esquadro, manter uma língua de boa reputação, manter segredo, e praticar caridade. A Maçonaria Especulativa está interligada à religião, para nos colocar sob as mais fortes obrigações de prestar homenagem racional à Deidade, o que constitui, em uma só coisa, nosso dever e nossa felicidade. Ela leva a pessoa contemplativa a ver com reverência e admiração as gloriosas obras da criação, e a inspira com as ideias mais elevadas das perfeições do Divino Criador (Preston81).
The accepted mason came to known about the middle of the eighteenth century as a speculative mason. The word “speculative” had come by easy transitions, and originally there was nothing in its meaning to suggest symbolism [...] “To speculate” is to take a view of anything with the mind, to consider anything mentally. It comes from specio, meaning “I see” or “I look”, and there we have the basis of many words, such as spectacle, spectator, speculum, etc. In the seventeenth-century meaning of the word, anyone who was given to contemplation, to thoughtfulness, was indulging in speculation. The speculative man was the idealista, not the man of fact and practice (Jones82);
Speculate means to contemplate, to ponder, to mediate, to theorize, and to conjecture. The word was first use Masonically in the Cooke MS of the early 15th century […] Speculative Freemasonry, is also called symbolic Freemasonry, since the working tools of operative Masonry are used as symbols to teach moral and philosophical lessons. The fundamental theme of Freemasonry is morality or ethics and, if these be taught and observed, other advantages, benefits, and virtues will follow naturally, such as charitable, religious, and philosophic attitude of mind Morality has been inculcated from the earliest of the Gothic Constitutions [...] Therefore, speculative Freemasonry teaches us a way of life that leads to happiness, well-being, to self-respect and consideration for others [...] see spiritual (Coil83).

Ora, salvo melhor juízo, como se queria demonstrar, nada mais tão antigo quanto a natureza especulativa que acompanha a humanidade, o que vai ao encontro do argumento em construção: na perspectiva da ars memoriae, de largo uso nas Escolas Iniciáticas – uma das fontes de inspiração da Maçonaria Especulativa -, abstraindo-se os aspectos formais e oficiais datados de 1717, a Maçonaria Especulativa, com efeito, antecedeu a Maçonaria Operativa.

Contudo, antes de encerrar esta seção, uma palavra de cautela:

Os traços da arte da memória clássica que a tornam particularmente relevante para a arte do maçom são óbvios. A arte era baseada em caminhar por um edifício sofisticado, e acreditava-se que ela trazia grandes poderes ao adepto, aumentando muito a capacidade da memória humana [...] podia facilmente adquirir implicações ocultas e, em certo sentido, baseava-se nas habilidades do arquiteto maçom. Frances Yates, apesar de não conhecer referências no Segundo Estatuto de Schaw à arte da memória, sugere uma ligação entre a arte - que usava uma estrutura arquitetônica em busca da sabedoria - e a Maçonaria [...] Mas tomando-se o Segundo Estatuto de Schaw a arte da memória pode agora ser diretamente associada ao desenvolvimento da Maçonaria, e as implicações do oculto, adquiridas pela arte, contribuíram para o desenvolvimento dos segredos e dos rituais maçônicos. Para que Schaw e os maçons usavam a arte da memória? Sem dúvida, a busca generalizada pela “ilustração” mística estava presente; mas, como já foi sugerido, a arte provavelmente era empregada para fins mais mundanos, como, por exemplo, memorizar os Antigos Deveres [...] A injunção de William Schaw de que os maçons fossem testados na arte da memória e sua ciência já foi lida por gerações de historiadores maçônicos, mas sua importância nunca foi devidamente observada. No entanto, essa curta afirmação é uma chave para compreendermos aspectos vitais das origens da Maçonaria, associando a arte operativa do maçom aos grandiosos esforços do mago hermético (Stevenson84).

E, à guisa de introduzir a próxima seção, uma citação que vincula a ambas:

Quais eram as coisas que a devota Idade Média queria lembrar? Certamente, aquelas relacionadas à salvação e à danação, os artigos da fé, os caminhos para o Paraiso, por meio das virtudes, e para o Inferno, por meio dos vícios. Essas eram as coisas esculpidas nas igrejas e catedrais, pintadas nos vitrais e nos afrescos (ICHSV85).

A memória, as artes liberais e as virtudes cardeais

Independentemente da abordagem arquitetônica, o recurso à, assim como o reconhecimento da importância da memória no contexto da Maçonaria, historicamente já estão consolidados, ainda que, infelizmente, tenha que se reconhecer que são temas raramente explorados com a profundidade e a extensão merecidas, sobretudo na Maçonaria brasileira. A difusão dos registros escritos, até chegar ao Google, confirmou plenamente o vaticínio dos sábios antigos, a exemplo dos já citados Sócrates e Platão: o de que a memória e todas as formas de raciocínio, doravante, seriam depreciadas, subutilizadas.

Destarte, conforme também já antecipado na Introdução, a arquitetura não foi a única porta de acesso da memória no seio da Ordem pois, por outra entrou mãos dadas com a Arte da Retórica, cuja relevância, desde a Antiguidade é destacada e se constitui em objeto de muitos estudos em razão das polêmicas que levanta pois, literalmente, serve ao bem e ao mal. Desde Platão, passando pelo clássico de Schopenhauer86, até hoje e à exaustão a retórica tem sido discutida.

Carvalho87 (2006) esclarece que

O discurso retórico tem por objeto o verossímel e por meta a produção de uma crença firme, que supõe, para além da mera presunção imaginativa, a anuência da vontade; e o homem influencia a vontade de outro homem por meio da persuasão, que é uma ação psicológica fundada nas crenças comuns. Se a poesia tinha como resultado uma impressão, o discurso retórico deve produzir uma decisão, mostrando que ela é a mais adequada ou conveniente dentro de um determinado quadro de crenças admitidas;
Na retórica antiga, o ouvinte é chamado juiz, porque dele se espera uma decisão, um voto, uma sentença [...] três tipos de discursos retóricos: o discurso forense, o discurso deliberativo e o discurso epidíctico, ou de louvor e censura (a um personagem, a uma obra, etc.). Nos três casos, o ouvinte é chamado a decidir: sobre a culpa ou inocência de um réu, sobre a utilidade ou nocividade de uma lei, de um projeto, etc., sobre os méritos ou deméritos de alguém ou algo. Ele é, portanto, consultado como autoridade: tem o poder de decidir.

É grande, portanto, para o exercício de qualquer atividade (pessoal, familiar, profissional, etc.) um mínimo de conhecimento (noções) de retórica, a qual, por sua vez, para a elaboração dos argumentos, não pode prescindir da memória, como bem atesta La Rocca88 quando cita Aristóteles:

Desde a antiguidade a Retórica (do grego rhetoriké), uma das sete artes liberais, está intimamente associada ao desenvolvimento da Arte da Memória. É interessante observar o modo como Aristóteles inicia o seu “Retórica”, escrito em 350 a.C.:
Retórica é o complemento da Dialética [...] Todos os homens fazem uso adequadamente, mais ou menos, de ambas; até certo ponto todos os homens tentam discutir declarações e as manter, se defender e atacar outro outros.

De outro lado também há alertas pois “[...] muito do foco da retórica está na plateia, e não no argumento puro e simples. E é esse aspecto que pode conduzir ao subjetivismo ou ao utilitarismo [...] outro aspecto da retórica: o embelezamento e a ordenação do discurso” (ICHSV89).

A retórica, por sua vez, é parte de um conjunto maior, o Trivium:

Podemos definir o Trivium como as três artes (ou ciências, dependendo do autor) da linguagem de acordo com a tradição educacional clássica no ocidente, sendo essas artes a Gramática, a Retórica e a Dialética. Por tradição educacional clássica, entenda-se aquela que vem desde os gregos, passando pelos romanos e culminando na cristandade europeia (ICHSV90).

E ambas, a retórica e a dialética, têm como antecedente a gramática, o que também autoriza percebê-las como um sistema - muito simplificadamente, não apenas um conjunto de partes interconectadas, mas orientadas por um objetivo que complementa e transcende aos objetivos das partes.

Finalmente, a terceira porta foi através de uma das virtudes cardeais, desde a Antiguidade também reconhecidas como virtudes-eixo porque em torno delas todas as demais virtudes orbitam, no caso a Prudência, constituída de 3 (três) partes: a memória, a inteligência e a providência. Mais detalhes sobre a virtude da prudência, assim como as suas relações conexas com as demais, podem ser vistos em Aquino91. Note-se que a memória, assim por vias indiretas, relaciona-se também à ética e à moral.

O trabalho de Santo Agostinho acrescentou mais importância à memória, pois ele a considerava uma das três partes da alma (sendo as outras a compreensão e a vontade), e ensinava que, explorando a memória, os homens poderiam encontrar uma imagem-memória de Deus imbuída em suas almas. O que começara como uma técnica utilitária para aperfeiçoar a memória agora adquiria importância na religião, não só como valioso método de incutir verdades religiosas na mente mas também como algo que em si tinha valor moral e levaria ao conhecimento de Deus (Stevenson92).

E considerando que As 7 Artes Liberais - Trivium e Quadrivium - ao lado das Virtudes Teologais (fé, esperança e caridade) e Cardeais (prudência, justiça, temperança e fortaleza) constituem os pilares sobre os quais se assenta a Maçonaria, independentemente se Operativa ou Especulativa, tem-se a exata dimensão que o estudo da memória deveria ocupar no projeto de docência das Lojas e ao qual deveriam ser submetidos os Iniciados.

E para que se tenha mais clara a importância da memória no cotidiano – seja na vida pessoal, familiar e profissional -, entre tantos vide La Rocca93, que em sua dissertação de mestrado trouxe inúmeros exemplos da aplicação da ars memoriae em um dos campos mais atuais, dinâmicos e promissores do mercado de trabalho: a realidade virtual - efetivamente, estabeleceu a ponte entre o passado e o presente, entre a teoria (aparentemente abstrata e difusa) e a prática (concreta, prenhe de expectativas).

Por oportuno, cabe lembrar (desculpem ...) qual o sentido da educação para os gregos na Antiguidade, pois, como se observa, ele vai ao encontro dos propósitos mais elevados da Ordem:

A grande diferença da Educação Grega para as outras é o fim e não os meios. Estes são sempre os mesmos: ensinar a ler, escrever, calcular, desenvolver a força e a saúde física, etc. Os fins, porém, são bem distintos: os gregos tinham apego à liberdade que nunca mais pudemos esquecer. Formar um homem livre e independente [...] era o fim da educação, e não formar um profissional competente, pois isto até escravos eram. Os gregos ensinavam os jovens a mesma coisa que outros povos civilizados, não para que fossem, como estes, escribas, arquitetos ou médicos, mas sim para que tomassem parte nas decisões públicas com um reflexo aqui embaixo daquilo que os deuses faziam lá em cima. É claro que esta educação também preparava os jovens para o trabalho, por mais que este não fosse o fim; o trabalho também é um meio de liberdade (ICHSV94).
Evidenciadas as íntimas relações entre a Memória, as Sete Artes, as Virtudes e a Maçonaria em geral, é hora então de brevemente retomar, para refletir em profundidade - o que é deixado ao leitor -, as consequências sobre esta última em razão do abandono, por ela mesma, sobretudo, mas não exclusivamente, da atenção à primeira. O diagnóstico mais amplo (origens, causas, contexto, etc.) assim como alguns cenários prospectivos (impactos e desdobramentos contemporâneos) podem ser encontrados em ampla literatura, em meio a qual ora destaco Ortega y Gasset95 96, Nougué97 e ICHSV98.
[...] tal conjunto (e especialmente o Trivium) resultou da confluência heterogênea de várias doutrinas, permitiu, todavia, uma abundância de bons frutos filosóficos e foi o sustentáculo educacional da mais pujante das civilizações que já houve na face da Terra: a Cristandade medieval (Nougué99).

Quando teria, então, ocorrido o ponto de inflexão? A resposta de Nougué100:

O principal fautor de tal derrocada, como mostrou José Monir Nasser, foi o “teólogo [...] tcheco Jean Amos Comenius (1592-1670), que, em sua principal obra, Magna Didactica, não apenas faz pouco caso das Sete Artes como estabelece as bases das pedagogias modernas, desenhadas para fins antes de distribuição social que de efetiva educação;
[...] algumas das notas da pedagogia moderna: arte universal, ensino rápido, resultado “infalível”, tudo estabelecido de antemão - o que redundará em algo que não lhe é o oposto senão aparentemente, porque, com efeito, é uma inelutável consequência sua: o renascimento do flatus vocis sofístico sob o justo nome de relativismo [...] Antes de tudo, as Sete Artes ordenavam-se à verdade e sua complexidade, ao passo que o ensino moderno visa a uma formação “simples” e “universal” [...].
Daí porque Weaver101 em resposta à sua crítica à Modernidade sugere as diretrizes para os futuros encaminhamentos:
Chegamos finalmente ao nosso empreendimento prático. Se a comunidade empírica de nada vale sem a comunidade metafísica da linguagem, o próximo passo obviamente terá de ser a reabilitação do mundo. E essa é uma tarefa para a educação [...] Ora, como o homem usa necessariamente tanto os recursos poéticos quanto os recursos lógicos da fala, ele precisará, pois, de um treinamento dobrado. A primeira parte deverá voltar-se para a literatura e a retórica; a segunda, à lógica e à dialética.

Não se pretende, é claro, sugerir que a Maçonaria venha a ocupar o vazio existente no sistema educacional que, registre-se, não é exclusivo ao Brasil. As limitações e os impedimentos são de toda ordem - inclusive legais -; entretanto, entre o “tudo e o nada”, sobretudo para uma Ordem que alguns autores, não sem orgulho apresentam como uma Escola Moral, há um largo espaço a ser explorado com criatividade, engenho e arte. E para não me estender em demasia, as coletâneas publicadas pela CMSB em 2020102 e em 2021103 podem ser um bom ponto de partida aos interessados.

Palavras finais

Este ensaio exploratório e especulativo é produto da leitura de um dos textos de F. Yates, do qual recolhi o que, neste texto, foi de denominado de “hipótese Yates”, a de que a passagem da Maçonaria Operativa à Especulativa pode ser explicada à luz de um quadro referencial mais amplo, o do desenvolvimento (centenário, milenar até) da ars memoriae. A “hipótese Yates”, ainda que não comprovada porque não submetida aos rigores dos cânones científicos, no caso a documentação robusta e variada com possibilidades de confirmação cruzada e redundante, encanta pela simplicidade e lógica porque se enquadra tanto no tempo quanto no espírito da época. Todavia, porque já abraçada por alguns estudiosos, tanto maçons quanto não-Iniciados, aos poucos tem logrado desenvolvimento e consolidação. Em razão dos argumentos expostos, penso que a “hipótese Yates” abre novos horizontes de estudos e considerações críticas, inclusive o reconhecimento de que a Maçonaria Especulativa não sucedeu à Operativa, tendo sido (e são) antes processos simultâneos, inerentes à condição humana, o que não impede o surgimento de saltos especulativos como o que teve início na Renascença, amadureceu ao longo da Modernidade e recebeu novo empuxo no Iluminismo.

Objeções: eventualmente alguém poderia arguir se a “hipótese Yates” não estaria limitada a alguns Templos maçônicos e só encontraria guarida em determinados Ritos, pois é sabido que enquanto alguns Templos são despojados e mesmo “genéricos”, outros possuem projetos específicos e decorações exclusivas conforme o Rito/Grau que, assim, constituiriam os espaços físicos indispensáveis à ars memoriae. Por oportuno, vale lembrar que o tempo referido por Yates é o do início da Modernidade, da passagem da fase Operativa à Especulativa, quando ainda não existiam os Templos tais como hoje conhecidos, talvez sequer mesmo fossem cogitados. Ademais, conforme visto, o templo contemporâneo, tal como desde a Antiguidade, pode ser analogado a qualquer espaço – a exemplo do salão de banquetes de Simônides – em meio ao qual os olhos atentos e treinados podem distribuir as referências à sua conveniência, como um ator situado no centro do palco.

Ainda, conforme visto, a presença da ars memoriae no seio da Maçonaria não se limita ao teatro, aos aspectos físicos da arquitetura, mas ampla e objetivamente pode ser encontrada em meio aos estudos das Artes Liberais e das Virtudes Morais, ambas tão caras à Ordem.

Mas enquanto se justifica que a “hipótese Yates” ainda não tenha recebido suficiente atenção dos estudiosos, sobretudo dos maçons brasileiros, por ser relativamente nova104, o mesmo não se aplica ao vazio a que foram relegados o Trivium e o Quadrivium, cujo estudo, quando ocorre, se verifica completamente apartado do processo formador (do ser humano) mais amplo e que está na gênese e na razão de ser da própria Ordem.

Por fim, ao observador mais informado salta aos olhos a amnésia coletiva que, por já há tempos se alastrar no seio da Ordem, hoje já lhe compromete as estruturas e dá azo ao surgimento de uma nova e desconhecida Maçonaria, sobre a qual não saberia fazer juízo de valor e prospectar, mas tão somente reconhecer como radicalmente distinta, irreconhecível até, da sua ancestralidade e que, com as exceções de praxe, mais se assemelha a um Clube de Amigos e rede de relacionamentos útil para os mais diversos fins, desde a ajuda mútua e a promoção do bem a terceiros, até para auferir vantagens exclusivamente pessoais.

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  1. 1 No mundo, grosso modo, Maçonaria está organizada em Potências Nacionais autônomas que praticam variados Ritos escalonados em Graus – cada Rito tem estrutura própria – e como a Maçonaria se autorreconhece como uma Escola Iniciática, cujos mistérios (ensinamentos) são desvelados pouco a pouco, o primeiro grau – o de Aprendiz - é denominado Iniciático. Mediante acordos de reconhecimento e amizade as Potências podem criar vínculos, direitos, deveres e compromissos recíprocos. É comum, a depender do contexto, que a Maçonaria também seja referida como Ordem ou Fraternidade.

  2. 2 Para assegurar a padronização (leia-se: qualidade) das ritualísticas, sobretudo das sessões extraordinárias, como são as destinadas à progressão de grau, as Lojas de Demonstração atuavam como “escolas e estágios teóricos-práticos” obrigatórios para os que desejavam exercer funções executivas nas respectivas Lojas. Ao fim e ao cabo, com o tempo, todos teriam passado pelos bancos das Lojas de Demonstração.

  3. 3 Plínio Virgílio Genz, A Maçonaria Inglesa no Brasil (São Paulo: Madras, 2013), 185.

  4. 4 Frances Amelia Yates, Giordano Bruno e a Tradição Hermética (São Paulo: Cultrix, 1990).

  5. 5 Frances Amelia Yates, El Iluminismo Rosacruz (Buenos Aires - Argentina: Fondo de Cultura Económica, 2001).

  6. 6 Frances Amelia Yates, A Arte da Memória (Campinas, SP: UNICAMP, 2007).

  7. 7 Cláudia Cerqueira do Rosário, “O Lugar Mítico da Memória”, Morpheus, ano 1, no. 1(2002): 1-6.

  8. 8 Hesíodo, Teogonia – Trabalho e Dias (São Paulo: Martin Claret, 2010), 25.

  9. 9 Yates, A Arte da Memória, 52-3.

  10. 10 George Orwell, 1984 (São Paulo: Cia. Editora Nacional, 2005).

  11. 11 Cristian Derosa, A Transformação Social (Florianópolis, SC: Estudos Nacionais, 2017).

  12. 12 Jeffrey Tucker, Liberdade ou Lockdown (São Paulo: LVM, 2021).

  13. 13 A propósito, deste Platão (428-347 a.C.), ainda que de modo bastante diferenciado do atual estado da arte em relação à matéria.

  14. 14 ICHSV, Trivium e Quadrivium (Porto Alegre: Instituto Hugo de São Vítor, 2020), 138-9.

  15. 15 Yates, A Arte da Memória, 374-375.

  16. 16 Rafael T. Prinke, “Memória na Loja - um recurso Mnemônico da Maçonaria no final do Século XVII”, Conference Proceedings Ciążeń, March 12-14, 2008. https://bibliot3ca.com/memoria-na-loja-um-recurso-mnemonico-da-maconaria-no-final-do-seculo-xviii/.

  17. 17 Robert L. D. Cooper, Revelando o Código da Maçonaria (São Paulo: Madras, 2009), 63.

  18. 18 Expressão, já anteriormente, em 2008, utilizada por Prinke.

  19. 19 Por se tratar de uma hipótese, embora consistente e já tendo reunidos apoiadores, ainda falta a comprovação documental, cruzada e redundante.

  20. 20 Os Iniciados que não exerciam o ofício de pedreiro, notadamente os nobres, militares e representantes da alta burguesia, mas também os comerciantes em geral e os trabalhadores de outros ofícios.

  21. 21 Rito-mãe, Primordial, o que deu origem aos demais na Era Moderna.

  22. 22 Bernard E. Jones, Freemasons` Guide and Compendium (Great Britain: Eric Dobby Publishing Ltd., 1994).

  23. 23 Henry W. Coil, Coil`s Masonic Encyclopedia (New York: Macoy Publishing & Masonic Supply Company, 1961).

  24. 24 Joaquim V. Mata, Palavra de Maçom (Barcelona-Espanha: ArteReal Comunicación W&GA, 2020).

  25. 25 David Stevenson, As Origens da Maçonaria (São Paulo: Madras, 2009).

  26. 26 Raimundo Lúlio, Livro das Bestas (São Paulo: Escala, s.d.).

  27. 27 George Orwell, A Revolução dos Bichos (São Paulo: Cia. das Letras, 2007).

  28. 28 556-468 a.C.

  29. 29 Yates, A Arte da Memória, 74.

  30. 30 Dean Hamer, O Gene de Deus (São Paulo: Mercuryo, 2005), 40-41.

  31. 31 Fulcanelli, O Mistério das Catedrais (Lisboa: Edições 70, 1964).

  32. 32 Celso Abrahão, Sementes da Razão, (São Paulo: Landmark, 2012).

  33. 33 Yates, A Arte da Memória, 171.

  34. 34 Yates, A Arte da Memória, 171-2.

  35. 35 Yates, A Arte da Memória, 179.

  36. 36 Milton José de Almeida, O Teatro da Memória de Giulio Camillo (Cotia, SP: Ateliê; Campinas, SP: UNICAMP, 2005).

  37. 37 Renata La Rocca, “Arte da Memória e Arquitetura” (Dissertação de Mestrado em Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo, Escola de Engenharia de São Carlos da USP, 2007), 129-130.

  38. 38 Stevenson, As Origens da Maçonaria, 126.

  39. 39 https://bibliot3ca.files.wordpress.com/2019/05/0000-mnemo5.jpg.

  40. 40 Kennyo Ismail, Ordem sobre o Caos (Brasília: No Esquadro, 2020).

  41. 41 Clarence A. Anderson. “A Arte da Memória e Maçonaria”, Bibliot3ca Fernando Pessoa, https://bibliot3ca.com/a-arte-da-memoria-e-maconaria/

  42. 42 Abrahão, Sementes da Razão.

  43. 43 Victor Guerra, A Maçonaria dos “Modernos”: história e ritualidade (Astúrias, Espanha: Masonica, 2020), 60.

  44. 44 Abrahão, Sementes da Razão.

  45. 45 Noah Gordon, O Físico (Rio de Janeiro: Rocco, 1991).

  46. 46 Yates, A Arte da Memória, 375.

  47. 47 Cooper, Revelando o Código da Maçonaria, 63.

  48. 48 Vitor Manoel Adrião, “Mary’s Chapel – a loja maçónica mais antiga do mundo”. Freemason, https://www.freemason.pt/marys-chapel-loja-maconica-antiga-mundo/

  49. 49 Coil, Coil`s Masonic Encyclopedia, 217.

  50. 50 Para o leitor menos familiarizado com a Maçonaria, atualmente a expressão Loja pode significar tanto a reunião (também referida como assembleia) de Irmãos, quanto o local no qual os maçons se reúnem, que pode ser ao ar livre ou, o que é mais comum, como visto acima, em um espaço físico determinado, a exemplo de uma sala. Algumas Lojas, a depender do Rito e a partir do final do séc. XVIII passaram a adotar, por arquitetura e decoração, elementos que remetem ao Templo de Salomão.

  51. 51 José Castellani, “O Primeiro Templo Maçônico”. Loja Maçônica Pentalpha nº 2239 GOSP/GOB https://arlspentalpha.webnode.com.br/news/o-primeiro-templo-ma%C3%A7onico/

  52. 52 Como ilustram os trabalhos de N. Copérnico (1473 – 1543), J. Kepler (1571- 1630) e outros.

  53. 53 Stevenson, As Origens da Maçonaria.

  54. 54 Yates, Giordano Bruno e a Tradição Hermética, 304.

  55. 55 Para a finalidade ora em tela é indiferente se Hermes existiu como pessoa (na antiguidade egípcia) ou foi um coletivo de escritores dos séculos II e III. Para maior aprofundamento sugere-se F. Yates - textos referenciados.

  56. 56 Yates, Giordano Bruno e a Tradição Hermética, 37-8.

  57. 57 Marcelo Gleiser, A Dança do Universo (São Paulo: Cia. das Letras, 1997), 129, 162, 164, 174.

  58. 58 Marcelo Gleiser, A Harmonia do Mundo (São Paulo: Cia. das Letras, 2006).

  59. 59 Philip A. Fanning, Isaac Newton e a Transmutação da Alquimia (Balneário Camboriú, SC: Danúbio, 2016).

  60. 60 O leitor que dispuser de mais tempo poderá refletir e concluir que a expansão das fronteiras da ciência abriu as portas e alavancou um novo ciclo do hermetismo. Há, para alguns, mais complementaridade do que oposição entre os dois domínios.

  61. 61 Prinke, Memória na Loja.

  62. 62 Cristian, A Transformação Social, 36.

  63. 63 Walter C. de Lima, “John Locke”, in Os Grandes Pensadores da Humanidade e o Rito Moderno, Org. Gustavo Patuto (Curitiba, PR: Independently published, 2020), 136.

  64. 64 Fanning, Isaac Newton e a Transmutação da Alquimia.

  65. 65 Fanning, Isaac Newton e a Transmutação da Alquimia, 149.

  66. 66 Anderson, “A Arte da Memória e Maçonaria”.

  67. 67 Prinke, Memória na Loja.

  68. 68 Três Iniciados, O Kybalion (Rio de Janeiro: Arcanum, 2017), 29-30.

  69. 69 Cooper, Revelando o Código da Maçonaria, 36.

  70. 70 William Schaw, reconhecido pelos escoceses como o Pai da Francomaçonaria, foi Mestre de Obras do Rei James VI, o seu Primeiro Estatuto data de 28.12.1598 e, o Segundo, de 28.12.1599.

  71. 71 Cooper, Revelando o Código da Maçonaria, 37, 62.

  72. 72 Cooper, Revelando o Código da Maçonaria, 63.

  73. 73 Retoma o Templo de Salomão (tema já comentado) como referência imagética para as atividades dos pedreiros (maçons).

  74. 74 Prinke, Memória na Loja.

  75. 75 Mata, Palavra de Maçom, 13-14, 16.

  76. 76 Mata, Palavra de Maçom, 23.

  77. 77 Gordon, O Físico.

  78. 78 Cooper, Revelando o Código da Maçonaria.

  79. 79 Guerra, A Maçonaria dos “Modernos, 79.

  80. 80 Walter A. Neves, Eliane S. Rapchan e Lukas Blumrich, A Origem do Significado (São Paulo: Cultura Didática, 2020), 48, 59.

  81. 81 William Preston, Esclarecimentos sobre Maçonaria (Rio de Janeiro: Arcanum, 2017), 34.

  82. 82 Jones, Freemasons` Guide.

  83. 83 Coil, Coil`s Masonic Encyclopedia, 631-2.

  84. 84 Stevenson, As Origens da Maçonaria, 125-6.

  85. 85 ICHSV, Trivium e Quadrivium, 79.

  86. 86 Arthur Schopenhauer, Como Vencer um Debate sem Precisar Ter Razão (Rio de Janeiro: Topbooks, 1997).

  87. 87 Olavo de Carvalho, Aristóteles em Nova Perspectiva (São Paulo: É Realizações, 2006), 36, 39-40.

  88. 88 La Rocca, “Arte da Memória e Arquitetura”, 42.

  89. 89 ICHSV, Trivium e Quadrivium, 141.

  90. 90 ICHSV, Trivium e Quadrivium, 100.

  91. 91 Tomás de Aquino, As Virtudes Morais (Campinas, SP: Ecclesiae, 2012).

  92. 92 Stevenson, As Origens da Maçonaria, 118.

  93. 93 La Rocca, “Arte da Memória e Arquitetura”.

  94. 94 ICHSV, Trivium e Quadrivium, 17.

  95. 95 Ortega y Gasset, A Rebelião das Massas e outros textos (Lisboa: Relógio D`Água, 1927).

  96. 96 A primeira edição de A Rebelião das Massas data de 1930, mas considerando-se tratar (também) de uma coletânea de textos anteriores, o primeiro publicado em 1927, opto por esta data, esclarecendo assim e antecipadamente eventuais divergências com outras edições.

  97. 97 Carlos Nougué, Do Papa Herético e outros opúsculos (Formosa, GO: Sto. Tomás, 2017).

  98. 98 ICHSV, Trivium e Quadrivium.

  99. 99 Nougué, Do Papa Herético, 15.

  100. 100 Nougué, Do Papa Herético, 15-16.

  101. 101 Richard M. Weaver, As Ideias têm Consequências (São Paulo: É Realizações, 2012), 180-181.

  102. 102 CMSB, Maçonaria - perspectivas para o futuro (Brasília, DF: CMSB, 2020).

  103. 103 CMSB. Maçonaria - pós-pandemia (Brasília, DF: CMSB, 2021).

  104. 104 A primeira edição de A Arte da Memória foi lançada em 1966.