Anticlericalismo maçom no Brasil da segunda metade do século XIX: o debate entre a “imprensa ímpia” e a imprensa católica

Freemason anticlericalism in Brazil in the second half of the 19th century: the debate between the “impious press” and the Catholic press

Ana Rosa Cloclet da Silva

Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Campinas, Brasil

anacloclet@gmail.com

ORCID: 0000-0001-7612-1130

Leonardo Henrique de Souza Silva

Pontificia Universidade Católica de Campinas, Campinas, Brasil

leonardohenrique.ss@outlook.com

ORCID: 0000-0002-2305-9959

Recepção: 21 de maio de 2024/Aceitação: 10 de junho de 2024

doi: https://doi.org/ 10.15517/rehmlac.v16i2.60063

Palavras-chave

Maçonaria; Anticlericalismo; Imprensa; Ultramontanismo; Questão Religiosa

Keywords

Freemasonry; Anticlericalism; Press; Ultramontanism; Religious Question

Resumo

O presente artigo busca explorar algumas nuances do anticlericalismo maçom no Brasil da segunda metade do século XIX, tendo como enfoque o período da Questão Religiosa (1872 – 1875). Para tanto, assume como objeto de estudo as formulações discursivas presentes em dois dos principais jornais maçons então editados no Brasil: o Boletim do Grande Oriente do Brazil (1871-1899) e o Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil (1873-1877). Do ponto de vista metodológico, ampara-se em duas referências principais: a Análise de Discurso, de matriz francesa, e a História dos Conceitos, de matriz koselleckiana, visando uma abordagem histórico-semântica.

Abstract

This article seeks to explore some nuances of Freemason anti-clericalism in Brazil in the second half of the 19th century, focusing on the period of the Religious Question (1872 – 1875). To this end, it takes as its object of study the discursive formulations present in two of the main Freemason newspapers then published in Brazil: the Boletim do Grande Oriente do Brazil (1871-1899) and the Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil (1873-1877). From a methodological point of view, it is supported by two main references: Discourse Analysis, from a French matrix, and the History of Concepts, from a Koselleckian matrix, aiming at a historical-semantic approach.

Introdução

O estudo da Igreja Católica moderna e contemporânea, bem como das várias manifestações do catolicismo nas sociedades seculares, envolve um debate conceitual e teórico que, há algumas décadas, tem procurado dar conta da complexidade representada pelas relações entre religião e modernidade. Definidos no quadro geral de experiências efetivamente revolucionárias detonadas ou, no mínimo, acentuadas pela Revolução Francesa (1789), estes vínculos reconfiguraram-se em resposta à marcha da secularização, desdobrada “no confronto social entre a ambição totalizadora da religião como horizonte de compreensão da integralidade da vida e o projeto unificador”1 encampado pela razão. Trata-se de um processo complexo, não linear, que resulta “da evolução das relações de poder entre tendências atuais e tradições” e que “não pararam de variar segundo as épocas, de um país a outro, e em função dos embates”2.

No caso do Brasil, tal processo se insere nos quadros de uma compreensão histórica mais ampla, comum a outros países latino-americanos, que reporta à dissolução do regime de cristandade ibérico, que teve lugar a partir – e em parte como resultado – da crise das metrópoles coloniais. Desde então, transformam-se as “formas como os indivíduos se relacionavam com o sagrado e com as instituições que o administravam”; as “funções e a organização dessas instituições”, bem como “os vínculos que estabeleciam até então com um poder civil, cujos fundamentos já não remetiam à religião herdada”, embora dela não pudessem prescindir. Estas transformações, segundo Roberto Di Stefano3, configuraram contextos de “modernidade religiosa”, conceito que traduz as experiências diferenciadas, embora profundamente conectadas, da secularização nestes países.

Assim, longe de permanecer como elemento atávico no processo de construção das sociedades modernas e seculares4, ou como mera guardiã das tradições, “sob esta mesma aparência de imobilidade, a religião muda, reestrutura-se, adapta-se, toma a iniciativa e enfrenta as provações da modernidade. É neste sentido que ela é moderna”5.

Foi neste contexto que se definiu o embate entre a vertente intransigente do catolicismo, tendo sua expressão mais dinâmica no chamado ultramontanismo6, e as tendências denominadas anticlericais. Se em relação ao primeiro termo a historiografia latino-americana tem investido certo esforço no sentido de associá-lo, simultaneamente, ao aspecto “conservador” da Igreja Católica ao nascente mundo moderno, bem como ao seu modo de reconstruir-se e reforçar-se enquanto instituição7, perante a onda revolucionária em curso8, em relação ao anticlericalismo as definições tem sido menos consensuais, assim como se revelam escassos os estudos da “contestação que se manifesta sob a forma de discursos anticlericais, expressões blasfemas, atos iconoclastas e afirmações heterodoxas”9.

No que toca à linguagem da Ciência política, aponta-nos René Rémond, os vocábulos clerical, anticlerical, clericalismo e anticlericalismo parecem ter surgido entre as décadas de 1850 e 1870, afinados aos programas diretivos da esquerda francesa10. Guido Verucci11 aposta no mesmo registro temporal, enfatizando, por sua vez, um processo mais longevo na construção semântica deste conceito, voltando-se às tensões entre Igreja Católica e as “novas experiências” associadas à modernidade ocidental. Tal vertente tem levado alguns estudiosos a identificarem a existência de “matizes anticlericais” na Europa ao menos desde as décadas finais do medievo, irrompendo do interior da própria Igreja Católica Romana12.

Considerando as experiências latino-americanas, parece-nos pertinente a definição proposta pela historiadora Nora Pérez-Rayón, segundo a qual o anticlericalismo se refere ao “[...] conjunto de ideias, discursos, atitudes e comportamentos que se manifestam criticamente (de forma pacífica ou violenta) em relação às instituições eclesiásticas”, tanto na esfera jurídica, quanto política. Ao mesmo tempo, tal ideário tendera a questionar e, não raro, desqualificar certos “dogmas, crenças, ritos e devoções”, rejeitando a “[...] tendência do poder eclesiástico de adentrar ou invadir o campo da sociedade civil ou do Estado, definido como clericalismo”13.

Segundo esta perspectiva, uma postura declaradamente anticlerical, expressa “[...] normalmente na rejeição de certos dogmas, na oposição ao abuso de poder do clero [católico] e a seus comportamentos morais”, parece ter sido delineada já no século XVI, em resposta aos regulamentos estatuídos no Concílio de Trento (1545-1563)”14. Todavia, reconhece-se que foi no transcorrer do século XVIII e, sobretudo, do XIX que o anticlericalismo encontrara reforçadores e difusores a partir das críticas racionalistas e liberais, modelando-se segundo ritmos, atores e formulações próprias, desde então15. Nestes termos, o pensamento revolucionário ilustrado tendera a interpretar a Igreja “[...] como um dos sustentáculos do Antigo Regime e da ordem colonial”16, orientando a compreensão iluminista de que o “progresso” somente seria alcançado em oposição à Igreja Católica17.

Detonadas pelo pensamento ilustrado na Europa e nas Américas e corporificadas nos movimentos sociais que se alastraram no decorrer do século XIX, tais matrizes político-filosóficas alimentaram uma onda anticlerical primordialmente direcionada à Igreja Católica Romana18, cujas orientações internas assumiam as marcas do pensamento ultramontano, mobilizado na defesa de um modelo de Igreja apoiado no dogma da infalibilidade do poder papal e da identidade da Igreja como instituição independente do poder civil19.

Embora manifestasse suas nuances em diferentes ritmos e locais, apoiando-se em atores diversos, o anticlericalismo dos oitocentos mantivera “[...] como eixo de seu discurso e ação a rejeição da interferência da Igreja e da religião na vida pública”, acenando com uma decisiva e almejada “separação entre política e religião, e entre Estado e Igreja”. Na confecção deste discurso, assumia-se “[...] a defesa dos valores da liberdade de consciência, autonomia moral e respeito pela pluralidade religiosa, bem como a submissão da Igreja ao direito comum”20.

Neste ínterim, a crítica anticlerical, alimentada pelo “[...] iluminismo e o filantropismo racionalista, o hegelianismo, o positivismo evolucionista e o positivismo materialista”21, assumiria uma roupagem decisivamente combativa ao modelo de Igreja formulado segundo diretrizes de Roma, bem como no que tange à sua ingerência em espaços referendados pelo princípio de soberania política de origem popular, à época fortemente evocado pelos emergentes Estados-nacionais22. Neste cenário, momentos de elevada tensão entre o religioso e o político, as chamadas “questões religiosas”, tornaram-se comuns nos espaços até então hegemonicamente católicos, delineando uma mesma “geografia político-religiosa”23, que, a um só tempo, integrava o Brasil e reconfigurava-se a partir desta integração.

As décadas de 1860 e 1870 marcaram a proliferação de posturas compatíveis com tendências anticlericais no Brasil, inclusive a partir do Parlamento. Por seu turno, a pulverização destas tendências entre lideranças político-partidárias parece ter encontrado forte sustentáculo em um dos grupos mais influentes nas histórias da política brasileira: as maçonarias24.

Mediante o exposto, este artigo busca explorar e apresentar algumas nuances das propostas maçônicas consonantes a uma postura pretensamente anticlerical, capazes de nos iluminar quanto às tendências assumidas, bem como às aproximações e diferenciações cruciais quanto aos demais casos ibero-americanos, a partir da análise de suas formulações discursivas. Assim, almeja-se contribuir com os ainda incipientes estudos voltados ao anticlericalismo maçônico no Brasil da segunda metade do século XIX, sobretudo no que toca às expressões assumidas no momento de maior tensão entre as obediências maçônicas e o episcopado católico do Brasil: a Questão Religiosa (1872-1875).

Para a análise deste problema, foram eleitos os dois principais jornais maçônicos em circulação no Rio de Janeiro naquele contexto: o Boletim do Grande Oriente do Brazil: Jornal Official da Maçonaria Brasileira, periódico de orientação monárquico-constitucionalista, editado na província do Rio de Janeiro, entre 1871 e 1899, ora bimestral, ora mensal, porta-voz dos maçons ligados ao Vale do Lavradio, o Grande Oriente brasileiro; e o Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil: Jornal Official da Maçonaria Brazileira, também editado na província do Rio de Janeiro, mas de periodicidade bimestral ou quadrimestral25, entre os anos de 1873 e 1877, vinculado ao círculo maçônico dos beneditinos, obediência maçônica à época irregular, fortemente alinhada a um discurso liberal-republicano26.

A opção pela fonte periódica repousa no entendimento de que, para “além da circulação e da divulgação de ideias, os jornais maçônicos representaram espaços privilegiados para as disputas políticas e ideológicas existentes no seio da Corte imperial brasileira [...].”27

No que toca ao estudo deste caso específico, consideramos válida a consideração do historiador Roberto Di Stefano, ao abordar outros casos latino-americanos, qual seja: o fato de que abordar a dissidência anticatólica nestes países implica considerar seu teor profundamente religioso. E isto, segundo ele, em dois sentidos:

A mais óbvia: é porque critica a religião, ou pelo menos as suas instituições. Mas também pode ser chamada de religiosa porque a lógica que a orienta e o capital simbólico em jogo, que é o dos bens da salvação, são religiosos, mesmo que seja um ataque contra esse capital e – mais do que tudo – contra aqueles que segure.28

Desse modo, em nossa análise dos impressos maçônicos do período recortado, torna-se imperativo levar em conta a constatação desde autor, sobre a incontornável presença simbólica do sagrado, do transcendente, mesmo nas atitudes mais radicalmente “antirreligiosas”.

A temática do anticlericalismo no Brasil da segunda metade do século XIX: o caso maçom

Ao menos desde o século XVIII, a Maçonaria foi genericamente associada às “sociedades secretas” condenadas pela Igreja Católica, com as repreensões do Papa Clemente XII (1730-1740) registradas na bula In eminenti apostolatus specula (1738). Dentre os motivos para tal rejeição, está a crença em uma suposta “incompatibilidade” entre o credo católico-romano e os princípios de obediência e discrição maçônicos. Soma-se a isto o entendimento corrente, por parte de diversos setores clericais, de que a Maçonaria seria, supostamente, uma instituição de cunho religioso rival do catolicismo, associada à uma “seita satânica, sobretudo pelo relato parcial que tinham do cerimonial maçônico”29. O uso de enxofre em determinados cerimoniais, por exemplo, realçara acusações de satanismo, refletindo em sua associação a práticas heréticas justificadas pelo grau de secretismo em torno de suas ritualísticas.

Durante o século XIX, quando a Igreja Católica abraçara em larga medida o corolário ultramontano, as maçonarias foram consideradas “males” e um dos “erros da modernidade”, elencados no Syllabus errorum, anexo à Encíclica Quanta Cura, ambos editados pelo papa Pio IX, em dezembro de 1864. Neste cenário, em que eram alvos de uma verdadeira “cruzada contemporânea” em nível transnacional, as células maçônicas encontraram lastro concreto para entoar uma inflamada crítica anticlerical30 em seus discursos e projetos pelo mundo francófono e ibero-americano31. Tal crítica voltava-se contra o modelo de “sociedade perfeita”, difundido pela Igreja romana e sustentado pelos católicos ultramontanos dos oitocentos32.

Segundo esse entendimento, a historiografia tem sustentado a compreensão de que seria justamente a partir destas “organizações discretas”33 que o posicionamento anticlerical parece ter assumido sua face mais acirrada no Brasil. E, em especial, a partir da segunda metade do século XIX, quando tal tendência tornar-se-ia mais aguda nos projetos e interesses maçônicos em circulação34 - politicamente influentes em um cenário marcado pela queda na participação dos clérigos na “vida político-partidária”35.

Durante as décadas de 1860 e, sobretudo, as de 1870 e 1880, as principais lideranças maçônicas no Brasil – os beneditinos e os membros do Lavradio - congregaram esforços em uma tônica discursiva bastante crítica quanto aos projetos civilizatórios tributários do catolicismo-ultramontano, pautados, dentre outros elementos, na obediência irrestrita a uma liderança tida como infalível e acima do direito moderno: o pontífice romano, cuja ingerência ia além do âmbito espiritual, sendo por isso alvo central das críticas maçônicas36.

Tal postura acabaria atuando como um dos catalisadores dos episódios que culminaram na chamada “Questão Religiosa” (1872-1875). Fase decisiva no processo de secularização da sociedade brasileira37, ainda hoje é considerada pela historiografia como um dos fatores que contribuíram no desgaste da monarquia e na crise do Império no Brasil38.

Cabe-nos observar que tais embates, que reconfiguraram as relações entre religião e política no Brasil e que tiveram como ápice uma verdadeira guerra discursiva por meio da imprensa, levaram alguns autores a associarem diretamente a postura maçônica neste país àquela observada em outras experiências ibero-americanas, como no caso argentino39. Noutros termos, a crítica encampada pelas maçonarias no Brasil ao catolicismo ultramontano será diretamente tomada como uma perspectiva compatível com o conceito de anticlericalismo veiculado no mundo europeu e hispano-americano, tendo sido capaz de ressignificar traços da própria identidade maçônica do período40.

Todavia, é preciso cautela antes de colocarmos maçonarias e anticlericalismos no mesmo campo semântico, como espécies de correlatos simétricos, em termos koselleckianos41. Reproduzida nas ainda pouco numerosas problematizações quanto a temática42, associação genérica entre maçonarias e anticlericalismo-ilustrado no Brasil dos oitocentos tende a replicar os moldes observados em experiências vizinhas, enfatizando uma postura anticlerical mais restrita, correlata a uma oposição direta e frontal ao clericalismo católico e ao próprio catolicismo enquanto religião, amparada nas teses ilustradas.

Contudo, uma análise atenta da atuação discursiva através da imprensa periódica de membros das duas obediências maçônicas tomadas como objeto desta pesquisa, pautada nos pouco numerosos trabalhos acadêmicos sobre o tema, leva-nos a uma conclusão, no mínimo, mais ponderada. Assim, se por um lado é possível concordar que as maçonarias no Brasil desenvolveram uma postura compatível com tendências anticlericais, por outro, esta postura comportou nuances e singularidades, derivando uma espécie de anticlericalismo católico, que passaremos a analisar.

A imprensa maçônica contra o catolicismo ultramontano: um caso de anticlericalismo católico?

Em seus principais periódicos editados e veiculados na capital imperial, as lideranças maçônicas encamparam uma crítica férrea ao que julgavam serem as “pretensões invasoras do clericalismo”43. Pareciam ver no catolicismo ultramontano a expressão do que havia de mais “desprezível” a ser combatido44, afirmando que, sob sua primazia, o “[...] templo [religioso] deixou de ser casa de oração, a casa do Senhor para se transformar num vasto mercado onde os ministros do altar exercem sua indústria.”45. Chegam a taxar o papado de Pio IX como “programa da mais intolerável teocracia”46.

Analisando estes periódicos, constata-se a mobilização de uma rede conceitual e metafórica na formatação de um discurso combativo ao que pode ser entendido como “clericalismo ultramontano”, considerado uma “[...] associação perigosíssima, na qual a ignorância, a calúnia, o ódio, a injúria e a satânica propaganda, andam como armas”47.

Em publicação encontrada nas páginas do Boletim do Grande Oriente do Brazil, na edição de julho de 1873, observa-se que o Templo maçônico era tomado como símbolo de filantropia, suposto santuário dos bons costumes, a escola da sabedoria, sustentado pelo sangue dos maçons do passado que se sacrificaram pela causa em meio às perseguições impostas pela Igreja Católica. Com base nessa memória de longa duração, os maçons do século XIX deveriam se engajar no combate à “seita” ultramontana48 e seu assim declarado obscurantismo49, recorrendo às armas discursivas:

Nós, MMaç... do século XIX, colhemos, verdade é, os frutos do sangue derramado por nossos Ilr... nos séculos passados, não nos é mais mister para combater nem de espada, nem de punhal, nossas existências não estão mais ameaçadas, porque a Maçonaria é universalmente considerada como o Templo da filantropia, o santuário dos bons costumes e a escola da sabedoria. Contudo, se os Ilr... que nos precederam cumpriram uma tarefa imensa, resta-nos a nós cumprir uma imensamente maior; e bem que seja com outras armas, é nosso dever combater. Existe uma seita ardente cujo nome e atos não serão de certo objeto de veneração para o futuro, e que por uma inextinguível sede de poderio tem transformado a seu belo prazer as sublimes doutrinas do grande pensador de Nazaré e delas assim transformadas, se tem servido para subjugar moral e materialmente os povos e tê-los encerrados num círculo de ferro no seio das trevas da ignorância e da superstição. É contra esta seita e contra o obscurantismo, que lhe é necessário para assegurar a estabilidade de seu poder, que devem dirigir-se presentemente todos os esforços da Maçonaria50.

Sob este aspecto, é curioso notar que os editores maçônicos operaram uma inversão nos usos do conceito de seita, o qual, tradicionalmente, fora aplicado pelos ultramontanos – e pela própria Igreja Católica, de modo mais longevo –, para nomear e condenar maçons e protestantes51:

Existe uma seita ardente cujo nome e atos não serão de certo objeto de veneração para o futuro, e que por uma inextinguível sede de poderio tem transformado a seu belo prazer as sublimes doutrinas do grande pensador de Nazaré e delas assim transformadas, se tem servido para subjugar moral e materialmente os povos e tê-los encerrados num círculo de ferro no seio das trevas da ignorância e da superstição. É contra esta seita e contra o obscurantismo, que lhe é necessário para assegurar a estabilidade de seu poder, que devem dirigir-se presentemente todos os esforços da Maçonaria52.

Em contrapartida, viam no ultramontanismo a personificação daquilo de mais desprezível a ser combatido, afirmando que, sob a primazia deste catolicismo, o “[...] templo [religioso] deixou de ser casa de oração, a casa do Senhor para se transformar num vasto mercado onde os ministros do altar exercem sua indústria.”53. Uma formulação discursiva que, mediante um aparato simbólico e semântico de longa duração, alicerçado na fusão de elementos maçons e católicos, parece ter ressoado uma preocupação pedagógica54 por parte dos editores destes jornais. É válido ressaltar que, naquela conjuntura, tornara-se comum, nestes impressos maçônicos, o uso de estratégias editoriais de retenção de novos públicos, de forma a conquistar novas e ativas vozes em suas batalhas contra o ultramontanismo55, justificando a contínua mobilização de um discurso pedagógico, de remodelagem das consciências.

Ao mesmo tempo, entoavam uma resoluta defesa de um suposto “catolicismo verdadeiro”56, isto é, aquele que se restringia ao âmbito espiritual, nada pendendo ao político. Ou seja: o que criticavam não era o catolicismo enquanto religião, mas a interferência da instituição eclesiástica na esfera de ingerência concebida como exclusiva do poder temporal. Sob esta tônica discursiva, as obediências maçônicas julgavam-se como “[...] a suprema garantia, a derradeira defesa, o último baluarte com que conta a civilização para resistir à invasão do despotismo clerical.”57.

Em meio ao clima de tensões que engendrou tais discursos, não seria raro que a Maçonaria se apropriasse de uma leitura teleológica da História, a partir de seu próprio aparato memorial – a “memória discursiva”, como teoriza Orlandi58 -, para criticar as ideias e dogmáticas tridentinas, encaminhadas pelo episcopado ultramontano.

Em sua crítica às prerrogativas do Syllabus, que lastreara a contundente postura condenatória aos assim considerados “inimigos da Igreja” e ancorados na defesa do princípio da liberdade religiosa, os redatores do Boletim do Grande Oriente do Brazil afirmavam que a instituição maçônica, tão atacada por tal vertente do catolicismo, seria a legítima “coluna” do Oriente da Igreja, seu sustentáculo desde tempos longevos. Em outras palavras, viam-se como responsáveis pela defesa e propagação dos referencias cristãos, como símbolo de sua manutenção e reafirmação ao longo das eras, não de sua fragilização:

[...] desde séculos remotos a Instituição Maçônica está na Igreja, crente, suplicante, humilhada ante Deus, exercendo a caridade, aceitando e beijando as frases ungidas do Evangelho, e repelindo os inimigos do Senhor, ou aqueles que blasfemam de suas divinas doutrinas. Ela foi, e há de ser por todos os séculos a coluna do Oriente da Igreja [...]. Ela recorda Maria, a Santíssima entre as mulheres, a Imaculada Mãe, a fonte de todos os perdões e o seio castíssimo de todas as liberdades da alma e do coração59.

A edição n. 12 do Boletim do Grande Oriente do Brazil, de 1874, versara sobre a situação política e social do norte do império, onde o “jesuitismo” – conceito este que na imprensa maçônica assumira situação correlata ao de ultramontanismo - estaria avançando em sua “senda obscurantista” contra o “povo combatente, patriota, prudente”, adjetivos aplicados em referência aos maçons daquela região. Acreditavam, inclusive, na possibilidade de que seus “irmãos” já tivessem sido derrotados pelos “assassinos e malvados” liderados pelo “domínio do infalível”, referindo-se ao Papa - à época, Pio IX60. Na publicação, torna-se bastante claro que a instituição temia que tal cenário, marcado pela defesa férrea dos jesuítas por parte do bispo D. Vital61 e o consequente tensionamento público com relação aos maçons integrantes de ordens e irmandades católicas62, se alastrasse para o sul do Império, convocando seus membros – “defensores da paz, da tolerância, da justiça” - para a batalha generalizada que se desdobraria pela “trama da seita ultramontana” contra o progresso da civilização63. Conceito este que, em seu processo de generalização, ganha conotações distintas e um marcado acento cristão, no caso do discurso ultramontano64.

Quando observadas as experiências ibero-americanas, “o advento da modernidade política foi marcado por mutações conceituais, que acompanharam e refletiram as complexas reconfigurações observadas nas relações entre o religioso e o secular”. Neste campo, um dos conceitos que mais refletiram tais mutações, ao menos desde meados do século XVIII, fora o de civilização. Embora tenha passado por transformações desde o início de sua dicionarização, o conceito preservara, mesmo no decorrer do século XIX, “sua capacidade de remeter ao universal e ao particular, funcionando como mediador de uma pluralidade de experiências e base para se pensar o processo de diferenciação das esferas em relação à religião”65. Dentre outros usos, estivera a apropriação feita pelo catolicismo ultramontano pelo conceito de civilização, em um contexto em que recrudescia sua postura combativa aos supostos “erros modernos”. Ao passo que construíam uma rede conceitual condenatória aos pretensos inimigos da Igreja, passaram a associar, enquanto pares correlatos e simétricos, os conceitos de civilização e cristianismo. Assim, amparados em vertentes do tradicionalismo católico europeu, a verdadeira civilização se tornava, desde então, sinônimo de catolicismo-romano, considerado a matriz da verdadeira e única civilização.

Meses antes, em publicação de novembro de 1873 junto ao Boletim do Grande Oriente do Brazil, temos a transcrição de um discurso empreendido em cerimônia de elevação de maçons ao grau de Mestre. Nesta, torna-se claro aquilo que o Grande Oriente entendia como guerra ao “absolutismo”, à “intolerância”, ao “autoritarismo”, características empregadas em referência aos ultramontanos como forma de enfatizar, discursivamente, seu combate urgente:

A luta que se ergue além é a do absolutismo que, orgulhoso e presumido, arroja-se à desmarcada pretensão de só ele possuir e impor a verdade; é a luta dos intolerantes que pretendem ensinar com o tom do oráculo; é a luta do predomínio cego e autoritário; é, enfim, a luta da ambição66.

É possível constatar que, nestas publicações, os editores maçônicos incorporavam o mesmo tom “escatológico”, apocalíptico do catolicismo ultramontano67, porém secularizando-o. Uma “escatolologia secularizada”, própria às filosofias especulativas da História e ao pensamento iluminista, conforme apontada na crítica de Koselleck68.

Em alinhavo, os excertos acima parecem confirmar a tese proposta por este artigo: embora tenham assumido publicamente uma férrea oposição ao catolicismo ultramontano, as lideranças maçônicas não se opuseram frontalmente ao catolicismo enquanto religiosidade particular - pelo contrário, defendiam-no, demarcando naquela conjuntura aquilo que se pretende defender: um anticlericalismo profundamente católico69. O que rechaçavam, à altura, era uma religião dogmática, institucionalizada, centralizada em figuras supostamente intolerantes e tirânicas e que desaguava na esfera temporal seus próprios interesses, em detrimento da soberania do poder civil70, engajados em uma suposta “guerra atroz feita à civilização”71.

Além disso, do ponto de vista discursivo, compartilhavam de uma mesma estrutura, um “modo de dizer”, com teor escatológico, anunciando uma guerra entre a “seita” ultramontana e a civilização moderna, pretensamente representada e defendida pela Maçonaria. Por fim, inseriam-se num mesmo campo semântico, apropriando-se dos mesmos conceitos mobilizados pelos ultramontanos no seu combate contra os erros da modernidade, mas emprestando-lhes significados opostos – a exemplo dos conceitos de seita72, civilização, liberdade religiosa e mesmo o de revolução73.

Tal entendimento este que nos leva ao encontro do que fora defendido pelo historiador Roberto Di Stefano74, para quem, ao longo do século XIX, os discursos anticlericais verificados nas experiências ibero-americanas baseavam-se, fundamentalmente, no aspecto religioso.

Na defesa desta tese, apoiamo-nos no quadro teórico suscitado por Michel Goulart da Silva, para quem, embora plural e heterogêneo, historicamente o anticlericalismo não representou uma oposição férrea ao catolicismo professado, nem à fé católica ou aos seus princípios filosóficos e humanitários. Poder-se-ia afirmar que, “[...] em certa medida, as manifestações anticlericais foram uma resposta à manutenção, mesmo após as Revoluções Burguesas, da influência da religião sobre a sociedade e o Estado.”75.

Anticlericalismo católico: uma análise a partir da semântica histórica

A partir da análise da atuação das obediências maçônicas através da imprensa, no seu embate contra o catolicismo ultramontano, acredita-se ser pouco concreto assumir o “anticlericalismo” na qualidade de um movimento organizado no interior da Maçonaria brasileira. Isto porque, se a instituição não alcançara nem mesmo uma coesão propositiva e filosófica – cindida em duas obediências, cada qual sob um rito específico76 -, parece pouco provável que tenha definido um posicionamento articulado, no campo das ideias, em oposição a um pretenso clericalismo romano. Entretanto, ao pensarmos o “anticlericalismo” enquanto conceito, outras possibilidades são apresentadas.

Embora fossem manifestamente contrários ao modelo de Igreja e sociedade veiculado pelo catolicismo ultramontano – ao qual opunham um projeto civilizatório ilustrado e progressista, em sentido material e intelectual -, as fontes maçônicas analisadas não são claras quanto à efetiva e organizada mobilização de uma proposta anticlerical por parte das maçonarias no Brasil daquele contexto. Ao menos não no sentido de pretender denotar e conotar um posicionamento coeso e articulado em torno de programas combativos unificados, como fora o caso argentino do mesmo período77, por exemplo. Quando muito, algo próximo a esta coesão se deu no contexto da Questão Religiosa, quando os dois Orientes, momentaneamente, uniram-se em oposição à postura da Igreja católica, notadamente no que tocava à expulsão de maçons das irmandades e dos templos católicos, ferindo a própria possibilidade do maçonismo católico até então vigente.

Daí a hipótese sugerida: parece-nos, em verdade, que um anticlericalismo, assim conceituado e registrado no discurso veiculado pela imprensa católica da segunda metade do século XIX aparecia muito mais no sentido acusatório e direcionado pelos ultramontanos aos atos dos então considerados inimigos da Igreja. Nada indica, por sua vez, ser este um conceito assumido positivamente na autoafirmação de uma suposta identidade coletiva e propositiva por parte das maçonarias.

Alguns elementos corroboram esta hipótese. Primeiramente, o catolicismo ultramontano no Brasil, informado das experiências revolucionárias francesas sobretudo por meio de documentações apostólicas e jornais católicos estrangeiros – fontes que, de alguma maneira, podemos chamar de “viciadas” -, nutrira um conhecimento específico do “estado de coisas” no mundo europeu. Com base neste conhecimento do que então se passava na Europa, os ultramontanos no Brasil vão sinalizar com o iminente desmonte da verdadeira civilização, aos “ataques” à legítima religião, à corrupção moral e dos costumes, à medida que o referencial cristão-católico vai deixando de ditar as regras do jogo político, social e cultural. Neste campo de trocas e apropriações semânticas, tal qual constatada na mobilização de variados conceitos – vide o caso do conceito de heresia78 -, os jornais ultramontanos parecem ter absorvido o conceito de “anticlericalismo” para o caso brasileiro, importando, assim, polêmicas do estrangeiro. Entretanto, os usos deste conceito parecem ter sido menos explícitos, já que, mesmo nos periódicos católicos, o conceito de anticlericalismo quase não aparece79.

Evidentemente, as experiências francófona e luso-brasileira diferenciam-se. A Revolução Francesa, porém, inculcara em significativa parcela do clero católico um temor generalizado em torno da possibilidade de outras experiências similares ocorrerem, justamente em um momento em que a Igreja galgava estratégias reformistas em prol da manutenção de seus status, apoiadas no ideário ultramontano.

É neste sentido que, para dimensionar entre os fiéis locais a “real” periculosidade vislumbrada num horizonte de possibilidades emanado do mundo francês ilustrado, uma série de conceitos utilizados na tessitura destas mesmas experiências externas foram sendo apropriados e utilizados para nomear situações locais. Assim, alguns conceitos, extraídos de seus contextos originais de uso, adquiriam uma outra dimensão: extrapolavam as fronteiras nacionais, por meio da circulação dos impressos, constituindo uma rede semântica em escala transnacional80. Daí a fundamental característica inerente ao próprio conceito: seu elevado grau de generalização e polissemia, o que, segundo Koselleck, constitui uma das principais qualidades dos conceitos, tornando-o capaz de ser empregado em outras espacialidades e temporalidades, conservando sentidos de longa duração e adquirindo outros de natureza contingencial81.

Ao mesmo tempo, projetos anteriores atestaram a contundente criticidade imposta pelas células maçônicas em relação aos projetos e tentativas regulatórias emanadas do catolicismo ultramontano, sobretudo em relação ao clericalismo e às estruturas hierárquicas centralizadas em Roma. Não poderíamos então dizer que, de fato, foram as Maçonarias focos de uma postura anticlerical no Brasil dos oitocentos? Trata-se de uma realidade menos evidente do que a literatura especializada tendeu a afirmar.

Analisando os dois principais jornais maçônicos da época, o Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil e o Boletim do Grande Oriente do Brazil, o conceito de “anticlericalismo” não aparece uma única vez82! Situação bem distinta do que seria acompanhado já nas décadas iniciais da República. Basta rememorarmos a criação e veiculação do jornal maçônico A Lanterna83, fundado em São Paulo, em 1901, sob inspiração abertamente anticlerical – mesmo no universo semântico modelado – a qual fora diretamente injetada em suas páginas por seu editor responsável: Benjamim Mota, advogado, maçom e militante anarquista84.

Pensa-se, neste âmbito, na seguinte hipótese. Com uma tradição local que remonta aos períodos anteriores à instalação da Família Real no Brasil, em 1808, a Maçonaria brasileira desenvolvera-se não apenas intimamente relacionada à própria formação do Estado brasileiro e às dinâmicas políticas gestadas desde os anos 1820 - tendo sido um dos baluartes do movimento de independência neste país85 - como nutriu a forte consciência dos vínculos institucionais e culturais entre a Igreja Católica e o Estado imperial. Nestes termos, uma oposição anticlerical mais organizada e autodeclarada ao episcopado ultramontano, mesmo na segunda metade do século XIX, marcada por debates travados segundo conceitos como secularização e laicização, poderia, potencialmente, reverberar em tensões com próprio Estado.

Nestes termos, julga-se plausível pensar que não seria do interesse imediato das lideranças maçônicas colidir frontalmente com o Estado Monárquico, testando os limites de seu capital político com uma postura abertamente definida como anticlerical num contexto cultural profundamente católico. Assim, mesmo quando acenavam com o rompimento com o clericalismo, não rompiam com o fundamento religioso do Estado e da sociedade brasileira. Tal cenário é realçado quando consideramos que, ao menos no Brasil, a Maçonaria institucionalizada nunca contara, de antemão, com sua manutenção garantida, em termos de sua institucionalidade, principalmente quando se considera um contexto em que os próprios rumos do Estado não eram certos e em que havia grande urgência em construir suas bases sociais de apoio. Daí a dubiedade da situação da Maçonaria no Brasil dos oitocentos: ora favorecida, ora execrada. Basta rememorarmos a conjuntura do Primeiro Reinado, quando D. Pedro I, a despeito de ter sido aceito e iniciado na Ordem, em 2 de agosto de 1822, tornando-se Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil em menos de dois meses, colocara a Maçonaria na ilegalidade, em outubro de 1822, decretando o fechamento de todas as lojas afiliadas ao Grande Oriente86 - reabertas, paulatinamente, a partir de 1831, muito embora as reuniões maçônicas individuais nunca tenham deixado de ser realizadas87.

Além disso, alinhando a reflexão aos trâmites institucionais e à maquinaria imperial da década de 1870, o então grão-mestre do Grande Oriente do Brasil, Visconde do Rio Branco, tornara-se um proeminente estadista no Império, ocupando, entre 1871 e 1875, o cargo de Primeiro Ministro, escolhido por D. Pedro II. Tratava-se de uma oportunidade áurea para estreitar laços, solidificar institucionalmente a presença maçônica no Brasil e ainda angariar cadeiras parlamentares dotadas de capital político efetivo para referendar seus interesses e projetos civilizatórios. O que poderia legitimar seu combate a certas proposições do ultramontanismo, por meio das vias político-institucionais. Perspectiva esta reforçada num cenário em o Estado imperial se posicionava a favor dos interesses maçônicos em contraposição às exortações episcopais, notadamente no contexto da Questão Religiosa88.

Com a instauração da República e o Decreto 119-A, de 7 de janeiro de 1890, os vínculos institucionais entre Igreja Católica e Estado dissolviam-se e era garantida a liberdade de culto no país. É justamente neste momento que as lideranças maçônicas, ao menos no plano da veiculação de seus principais periódicos, parecem organizar-se de forma mais claramente anticlerical, inclusive recorrendo ao uso do conceito de “anticlericalismo” em suas formulações discursivas, como no caso do jornal A Lanterna, anteriormente citado. Ou seja, com o fim do regime do regalismo, as investidas maçônicas ao ultramontanismo já não atingiam, frontalmente, ao Estado, conferindo-lhes maior “liberdade” discursiva nos embates gestados.

Ao mesmo tempo, embora aplaudissem o fim do regime regalista, proporcionado pelo Decreto republicano, o episcopado ultramontano reagira enfaticamente contra à liberdade de crenças e consciências, “cujos esforços tomaram forma na Pastoral Coletiva de 1890”, documento amparado “numa reivindicação de cunho cultural e nacionalista” que “considerava o catolicismo apostólico romano como a religião dos brasileiros e o cimento do caráter nacional.”89 Neste mesmo documento, o termo anticlericalismo começa a ser mobilizado de forma mais contundente, para se referir àquela crítica genérica ao catolicismo institucional e clerical.

Isto porque, para o catolicismo ultramontano, Igreja-instituição e catolicismo-religião não se separavam, concepção esta a partir da qual o anticlericalismo seria notado como uma investida, a um só tempo, contra a estrutura clerical do catolicismo – neste caso, sua face institucional – e ao catolicismo enquanto religião e religiosidade. Assim, seus usos discursivos parecem remeter a uma espécie de conceito guarda-chuva, capaz de indicar uma genérica postura crítica ou mesmo reacionária dirigida a todo o universo cristão-católico, inclusive aos fundamentos do regime monárquico luso-brasileiro e ao que entendiam por civilização. E no caso do Brasil – bem como em outras experiências ibero-americanas – fora a Maçonaria que, por meio dos impressos, sempre mantivera uma postura mais reativa aos projetos ultramontanos e que, por conveniência, assumiria o manto de inimiga notória a ser “expurgada”.

Condenada pela Igreja desde o século XVIII e taxada como um dos erros da modernidade, com Gregório XVI e Pio IX, a Maçonaria seria o “bode expiatório” perfeito para o pensamento ultramontano denominar a ameaça “concreta” do anticlericalismo. O que direciona sua atuação num espaço público de circulação de ideias através de impressos, exortando esforços da “família católica” em seu combate definitivo contra a Maçonaria – evocando, sob esta tônica, a pretensa “nacionalidade” brasileira, essencialmente católica. Daí serem os maçons taxados, também, de bárbaros - porque, supostamente, contrários à civilização cristã -, hereges, entendidos como seita, como ímpios, como antirreligiosos. Acusações estas enfaticamente rechaçadas pelas lideranças maçônicas, que, em seus principais periódicos, reivindicavam a fraternidade – princípio caro à Maçonaria - como a primaz defensora e propugnadora da própria essência do catolicismo90.

Neste sentido, seria correto admitir que as maçonarias brasileiras não estiveram engajadas em posicionamentos compatíveis ou mesmo orientados segundo tendências anticlericais? Sua atuação discursiva, através da rede dos impressos aqui analisados, com o apoio de raros trabalhos acadêmicos na área, leva-nos a afirmar o contrário: ou seja, as maçonarias no Brasil desenvolveram uma postura anticlerical no que toca ao relacionamento com o modelo de Igreja e sociedade propugnado pelo catolicismo ultramontano. Porém, há de se destacar que o fizeram de modo próprio e menos explícito, moldando sua postura no interior de um campo religioso fortemente católico, reivindicado, em muitos de seus aspectos, pelos próprios maçons.

Deste modo, parece-nos que, ao menos quando se fala no cenário brasileiro dos oitocentos, o conceito de “anticlericalismo” foi imputado às ações maçônicas muito mais pela reação ultramontana do episcopado nacional, cuja fala fora posteriormente assumida por estudiosos do tema sem grandes ponderações críticas, ignorando-se que tal conceito não figurasse explicitamente nas fontes maçônicas. Seus sentidos, entretanto, estavam lá, isto é, pode-se verificar uma postura anticlerical na atuação maçônica através dos impressos. Porém não nos mesmos moldes encontrados nas experiências europeias, que tiveram no conceito de anticlericalismo um forte alicerce discursivo e, muitas vezes, identitário91.

Tal constatação leva-nos a retomar o ferramental koselleckiano quanto a uma questão fundamental, no que toca aos usos dos conceitos pelo historiador. Especificamente, quanto a distinção à qual se refere Koselleck, entre os “dois níveis” em que se movimenta a historiografia: aquele que remete aos fatos, abordando os “conceitos herdados da tradição”, enquanto “elementos servem de elementos heurísticos para apreender a realidade do passado”; e, um segundo nível, no qual “a história apoia-se em categorias acabadas e definidas ex post que não estão contidas nas fontes”92, para reconstituir determinadas facetas da realidade. Assim, parece-nos que, historicamente, o conceito de “anticlericalismo”, para o caso analisado, prestou-se ao segundo uso, abstraindo de determinadas singularidades dos casos concretos que, na contingência histórica dos acontecimentos, revelam-se muito mais diversificados e complexos.

Considerações Finais

O presente estudo incursionou uma investigação a partir de dois dos principais jornais periódicos maçônicos editados no Brasil da segunda metade do século XIX, buscando elementos discursivos que nos permitissem aferir que tipo de postura e pensamentos de tendência anticlerical foram expressos em suas formulações discursivas. Como enfoque temporal, houvera destaque ao período da Questão Religiosa (1872-1875), em que maçonarias e catolicismo ultramontano digladiaram-se de forma mais explosiva, por meio da imprensa.

Partindo do ferramental koselleckiano da História dos Conceitos, a qual permite-nos investigar a semântica histórica por trás dos nódulos constituintes do discurso, clareando-nos quanto aos sentidos manifestos em seus usos contingenciais, fora possível constatar a expressão de matizes anticlericais na tessitura dos discursos encampados pelos redatores destes jornais. Entretanto, um anticlericalismo que, diferente de outras posturas maçônicas europeias, abertamente antirreligiosas, parece ter assumido uma roupagem própria: um anticlericalismo católico.

Assim, ao mesmo tempo em que posicionavam-se de modo contrário aos desígnios e projetos ultramontanos em debate à época, criticando o dogmatismo, a estrutura clerical rigidamente hierarquizada e uma suposta concepção “obscura”, “atrasada” e “antimoderna” de mundo – tida como incompatível com as tendências ilustradas que seguiam -, as maçonarias desenvolveram discursos fortemente calcados na cultura religiosa católica, característica da maioria de seus membros no Brasil. Não apenas evocavam, em seus discursos, elementos característicos das Sagradas Escrituras, como ainda se posicionavam como os mais longevos defensores do catolicismo pelo mundo, reiterando uma concepção mitológica que mesclava o surgimento da Maçonaria com a expansão do cristianismo pela Europa. Um anticlericalismo, portanto, profundamente religioso, compartilhando das experiências de outros Estados ibero-americanos, como visto.

A partir destas constatações, algumas lacunas expressam potencial para desdobramentos futuros, em especial no que toca à materialidade das fontes analisadas. Isto porque os periódicos aqui analisados, por sua localização no seio da Corte Imperial, refletiram as dinâmicas e urgências contingenciais que pairavam na opinião pública e que movimentavam a cena política do Império – o que não significa dizer, de modo algum, que refletiam as preocupações administrativas, políticas e religiosas de todas as províncias, muito menos das de seus leitores, sejam eles diretos ou indiretos.

Desta forma, ao analisarmos tais impressos em uma perspectiva “em rede”, incluindo outros periódicos editados para além do Rio de Janeiro oitocentista, outros elementos discursivos podem contribuir na observação do problema do anticlericalismo maçom no Brasil daquele contexto, tanto fornecendo-nos novos e esclarecedores argumentos para a hipótese aqui desenvolvida, quanto, ainda, podendo-nos indicar posturas mais heterogêneas, condicionadas pelas obediências maçônicas seguidas e pelos fatores de natureza sincrônica. Pelas camadas de temporalidade que transversalizaram a produção desses impressos, refletindo e, a um só tempo, moldando a materialidade histórica pela via discursiva, rompendo as fronteiras nacionais e borrando definições estanques continuamente replicadas.

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  1. 1 Allan da Silva Coelho, “Secularização e Laicidade: abordagens destoantes para pensar a modernidade”, Impulso, vol. 26, no. 67 (2016): 85-98.

  2. 2 Segundo Rémond, esta complexidade é a contrapartida da dimensão filosófica e espiritual do debate que engendra a diversidade de pontos de vista que devem ser considerados. Ver René Rémond, Réligion et Société em Europe: La sécularisation au XIXe et XXe siècles (1789-2000) (Paris: Édition du Seuil, 2001), 107-108, tradução nossa.

  3. 3 Roberto Di Stefano, “Modernidad Religiosa y Secularización em La Argentina Del siglo XIX”, in Política, religião e diversidades: educação e espaço público, org. Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão Filho (Florianópolis: ABHR /Fogo, 2018), 135.

  4. 4 Viés este, em boa medida, tributário de modelos herdados das teorias clássicas da modernidade e da secularização, que, no caso das Ciências Sociais no Brasil, revela-se particularmente influenciado pelo paradigma weberiano, mediante o qual tais estudos tenderam a reproduzir a imagem do Estado como tendente a secularizar e da Igreja e seus agentes como resistentes a tal processo. Ver Carlos Alberto Steil e Sonia Rayes Herrera, “Catolicismo e ciências sociais no Brasil: mudanças de foco e perspectiva num objeto de estudo”, Sociologias, ano 12, no. 23 (2010): 353-393.

  5. 5 Francisco Javier Ramón Solans, “Le triomphe du Saint-Siège (1799-1823). Une transition de l’Ancien Régime à l’ultramontanisme?”, Siècles, no. 43 (2016): 1-12. Tradução nossa.

  6. 6 Rémond, Réligion et Société em Europe.

  7. 7 Ana Rosa Cloclet da Silva, “Imprensa católica e identidade ultramontana no Brasil do século XIX: uma análise a partir do jornal O Apóstolo”, Horizonte, vol. 18, no. 56 (2020): 542-569; Ítalo Domingos Santirocchi, Uma questão de consciência: os Ultramontanos no Brasil e o regalismo do Segundo Império (1840-1889) (Belo Horizonte: Fino Traço/São Luís: EDFMA, 2015).

  8. 8 Um embate no decorrer do qual se reformula sua própria “autocompreensão eclesial”, o modo como a hierarquia eclesiástica “[...] define um conceito de Igreja, estabelece suas tarefas e estratégias de ação e reordena sua política interna em função de seu projeto político e pastoral”. Ver Ivan Manoel, O pêndulo da história: tempo e eternidade no pensamento católico (1800-1960) (Maringá: Eduem, 2004), 10.

  9. 9 Roberto Di Stefano, “Disidencia religiosa y secularización en el siglo XIX iberoamericano: cuestiones conceptuales y metodológicas”, Projeto História, vol. 37 (2008): 158. Tradução nossa.

  10. 10 René Rémond, L’anticléricalisme en France de 1815 à nos jours (Paris: Fayard, 1999).

  11. 11 Guido Verucci, “Anticlericalismo”, in Dicionário de política, ed. Gianfranco Pasquino, Nicola Matteucci e Norberto Bobbio (Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998), 32-34.

  12. 12 Nora Pérez-Rayón, “El anticlericalismo en México. Una visión desde la sociología histórica”, Sociológica, año 19, no. 55 (2004): 113-152. Tradução nossa.

  13. 13 Pérez-Rayón, “El anticlericalismo en México”, ١١٥. Tradução nossa.

  14. 14 Ivo Pereira da Silva, “O papado de Pio IX e a dinamização transcontinental do anticlericalismo oitocentista: ecos no parlamento imperial brasileiro”, Almanack, vol. 26 (2020): 14.

  15. 15 Verucci, “Anticlericalismo”, 32-34.

  16. 16 Silva, “O papado de Pio IX e a dinamização transcontinental do anticlericalismo oitocentista”, 3.

  17. 17 Antonio Moliner Prada, “Clericalismo y anticlericalismo en la España contemporánea”, História: Questões & Debates, no. 55 (2011): 59-82.

  18. 18 Silva, “O papado de Pio IX e a dinamização transcontinental do anticlericalismo oitocentista”; Verucci, “Anticlericalismo”.

  19. 19 Santirocchi, Questão de consciência.

  20. 20 Pérez-Rayón, “El anticlericalismo en México”, 116. Tradução nossa.

  21. 21 Verucci, “Anticlericalismo”, 32.

  22. 22 Silva, “O papado de Pio IX e a dinamização transcontinental do anticlericalismo oitocentista”.

  23. 23 Silva, “O papado de Pio IX e a dinamização transcontinental do anticlericalismo oitocentista”, 3-5.

  24. 24 Alex Moreira Andrade, A maçonaria no Brasil (1863-1901): poder, cultura e ideias (São Paulo: Annablume, 2016); Alexandre Mansur Barata, “Maçonaria, sociabilidade ilustrada e independência (Brasil, 1790-1822)” (Tese de Doutorado em História, Universidade Estadual de Campinas, 2002).

  25. 25 Tais variações na periodicidade destes jornais refletiam a própria materialidade histórica, aumentando-se o número de edições publicadas a depender de assuntos urgentes a serem tratados – o que será comum no decorrer da Questão Religiosa, quando mais edições são publicadas no intento de sustentar a postura combativa e os projetos civilizacionais maçônicos em meio à opinião pública.

  26. 26 Tais jornais encontram-se disponíveis gratuitamente no portal da Hemeroteca Digital Brasileira, http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/

  27. 27 Thiago Werneck Gonçalves, “Periodismo maçônico e cultura política na Corte Imperial do Brasil (1871 – 1874)” (Dissertação de Mestrado em História Social, Universidade Federal Fluminense, 2012).

  28. 28 Roberto Di Stefano, “Disidencia religiosa y secularización en el siglo XIX iberoamericano: cuestiones conceptuales y metodológicas”, Projeto História, vol. 37 (2008): 158. Tradução nossa.

  29. 29 Andrade, A maçonaria no Brasil (1863-1901), 246.

  30. 30 Notadamente no âmbito da ingerência eclesiástica nos cemitérios e nos registros civis – essencialmente excluindo os maçons da possibilidade de estabelecerem matrimônio e serem sepultados no território brasileiro, a despeito de autodeclararem-se católicos -, a regulação moral do ensino e seu pretenso controle das consciências. Ver Eliane Lucia Colussi, “Espaços de secularização no século XIX: a atuação da maçonaria no Brasil e no Uruguai”, Estudos Ibero-Americanos, vol. XXIX, no. 2 (2003): 103-116.

  31. 31 Não é inédita a constatação de que a Maçonaria internacional desempenhara importante papel nos processos de secularização entre os séculos XVIII e XIX, notadamente no mundo ibero-americano, como apontado por Eliane Colussi. Tais organizações parecem ter se construído nos espaços coloniais americanos concomitantes a gestação de seus próprios processos de emancipação política. Galgando a solidificação e concretude de seus interesses, as células maçônicas veriam nos processos revolucionários um espaço adequado e profícuo, atuando fortemente ao nível político mediante referenciais iluministas franceses. Ver Colussi, “Espaços de secularização no século XIX”.

  32. 32 Andrade, A maçonaria no Brasil (1863-1901); Santirocchi, Questão de consciência.

  33. 33 Bruno Garcia Vinhola, “Maçonaria, do secreto ao discreto: comunicação organizacional e gestão da (in)visibilidade” (Tese de Doutorado em Comunicação e Informação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2021); Tiago Valenciano, “O Compasso, o esquadro e a ordem discreta: perfil sociológico dos Grão-Mestres da Maçonaria paranaense”, Revista NEP 2, no. 2 (2016): 221-239.

  34. 34 Notadamente no âmbito da ingerência eclesiástica nos cemitérios e nos registros civis – essencialmente excluindo os maçons da possibilidade de estabelecerem matrimônio e serem sepultados no território brasileiro, a despeito de autodeclararem-se católicos -, a regulação moral do ensino e seu pretenso controle das consciências, em oposição aos princípios ilustrados e racionalistas de plena liberdade de escolhas. Ver Colussi, “Espaços de secularização no século XIX”.

  35. 35 BRASIL, Câmara dos Deputados, O clero no Parlamento brasileiro (Brasília: Centro de Documentação e Informação, 1978).

  36. 36 Andrade, A maçonaria no Brasil (1863-1901); Gonçalves, “Periodismo maçônico e cultura política na Corte Imperial do Brasil (1871 – 1874)”.

  37. 37 Antonio Carlos Villaça, História da questão religiosa (Rio de janeiro: F. Alves Editora, 1974).

  38. 38 Ana Rosa Cloclet da Silva, Thais da Rocha Carvalho, “Ultramontanismo, Maçonaria e Protestantismo no contexto da Questão Religiosa (1872-1875)”, Estudos de Religiao 33, no. 2(2019): 27-53; Luiz Carlos Ramiro Júnior, “A questão Religiosa no Brasil: Interfaces entre religião, política e direito público”, (apresentação apresentada no 8º Encontro da ABCP. Encontro da ABCP, Gramado, 1-4 de agosto de 2012), 1-25.

  39. 39 José Zanca, Roberto Di Stefano, Fronteras disputadas: religión, secularización y anticlericalismo en la Argentina (siglos XIX y XX) (Buenos Aires: Imago Mundi, 2016).

  40. 40 Alex Moreira Andrade, A maçonaria no Brasil (1863-1901).

  41. 41 Reinhart Koselleck, Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos (Rio de Janeiro: Contraponto-Ed. PUC-Rio, 2006).

  42. 42 Em consulta ao portal da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações, encontramos apenas um trabalho que se propôs a analisar estes matizes do anticlericalismo maçom no Brasil por meio da imprensa: a Dissertação de Mestrado em Ciência da Religião pela PUC-São Paulo “O anticlericalismo brasileiro: A Lanterna revisitada (1901-1935)”, de Maria Emilia Martins Pinto Schuck. Todavia, o recorte temporal será o século XX, pós-Decreto 119-A. Carecemos, portanto, de trabalhos voltados ao presente problema ainda no século XIX.

  43. 43 Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil, no. 4-8, abril-agosto de 1875: 447. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=074594&pesq=

  44. 44 Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 3, março de 1873: 181. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=&pagfis=1

  45. 45 Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil, no. 1-3, janeiro-março de 1875: 266. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=074594&pesq=

  46. 46 Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 10, outubro de 1874: 406. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=&pagfis=1

  47. 47 Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 11, novembro de 1872: 382-383. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=&pagfis=1

  48. 48 É curioso observar como, naquele contexto, os editores maçônicos inverteram o uso do conceito de seita, tradicionalmente aplicado pelos ultramontanos – e pela própria Igreja Católica, de modo mais longevo –, para nomear e condenar maçons e protestantes. Ver Silva, Carvalho, “Ultramontanismo, Maçonaria e Protestantismo no contexto da Questão Religiosa (1872-1875)”.

  49. 49 Em ambos os periódicos analisados, o ultramontanismo é constantemente correlacionado ao conceito de obscurantismo, no sentido de que seriam sinônimos para a obstar a concretização das liberdades modernas, notadamente as de cunho religioso em meio a sociedade civil. Assim, o conceito de obscurantismo torna-se, na tônica discursiva maçônica da segunda metade do século XIX, um conceito cujos significados são alargados e diretamente vinculados ao de ultramontanismo, estabelecendo, assim, um par conceitual fortemente amparado em referenciais ilustrados. Denota-se, ainda, que Maçonaria e Ultramontanismo tornar-se-iam, naquela circunstância, conceitos antitéticos assimétricos. Ver Koselleck, Futuro Passado.

  50. 50 Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 7, 1873: 553. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=&pagfis=1

  51. 51 Silva, Carvalho, “Ultramontanismo, Maçonaria e Protestantismo no contexto da Questão Religiosa (1872-1875)”; Andrade, A maçonaria no Brasil (1863-1901).

  52. 52 Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 7, julho de 1873: 553. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=&pagfis=1

  53. 53 Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil, no. 1-3, 1875: 266. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=074594&pesq=

  54. 54 Segundo Orlandi, um “discurso pedagógico” poderia ser classificado como aquele em que uma suposta “voz do saber” se manifestaria por meio de um “professor”, uma espécie de guia legitimado pela posse de um dado saber. Seria este “professor”, por sinal, a depender das intencionalidades envolvidas, quem poderia “elaborar, manipular, modificar relativamente o saber estabelecido” em favor de alguma intencionalidade discursiva. Ver Eni Puccinelli Orlandi, A linguagem e seu funcionamento – As formas do discurso, (Campinas: Pontes, 1987), 245.

  55. 55 Gonçalves, “Periodismo maçônico e cultura política na Corte Imperial do Brasil (1871 – 1874)”.

  56. 56 Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 3, março de 1873: 181. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=&pagfis=1

  57. 57 Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brasil, no. 1, janeiro de 1873: 32-33. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=074594&pesq=

  58. 58 Eni Puccinelli Orlandi, Análise de discurso. Princípios e procedimentos (Campinas: Pontes, 2005).

  59. 59 Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 5, 1873: 321. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=&pagfis=1

  60. 60 Pontífice este que, entre as lideranças maçônicas da época, fora duramente criticado não somente pela proximidade e reafirmação das ideias ultramontanas, mas, sobretudo, pela convocação do Concílio Vaticano I, entre 1869 e 1970, o qual fixara o dogma da infalibilidade do poder papal, reforçando a estrutura clerical hierarquizada e, pretensamente, inquestionável emanada de Roma, alvo crucial dos questionamentos maçônicos.

  61. 61 D. Vital, Bispo de Olinda entre 1872 e 1878, além de um declarado defensor da Companhia de jesus, fora um dos maiores defensores do pensamento ultramontano no Brasil daquele contexto, protagonizando episódios de enfrentamento à Maçonaria – a exemplo da expulsão de maçons de irmandades religiosas sob sua jurisdição. Ver Rodrigo Dantas de Medeiros, “Dom Vital: a Questão Religiosa e a crise político-institucional no Segundo Reinado” (Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita, 2020).

  62. 62 Medeiros, “Dom Vital: a Questão Religiosa e a crise político-institucional no Segundo Reinado”.

  63. 63 Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 12, 1874: 572-573. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=&pagfis=1

  64. 64 Ana Rosa Cloclet da Silva, “O binômio civilização-cristianismo para o caso brasileiro (1750 a 1891)”, in El lenguaje de la secularización en América Latina: contribuciones para un léxico, eds. Elisa Cárdenas Ayala e Francisco Ortega (Santander: Editorial de la Universidad de Cantabria; Guadalajara, Jalisco: Universidad de Guadalajara, 2023), 45.

  65. 65 Silva, “O binômio civilização-cristianismo para o caso brasileiro (1750 a 1891)”, 45.

  66. 66 Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 11, 1873: 827. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=&pagfis=1

  67. 67 Presente, em larga escala, nos jornais periódicos ultramontanos editados no Brasil daquele contexto, sobretudo O Apóstolo.

  68. 68 Koselleck, Futuro Passado; Leonardo Henrique de Souza Silva, “A ‘semântica do mal’ na imprensa ultramontana no Brasil da segunda metade do século XIX” (Dissertação de Mestrado em Ciências da Religião, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, 2023).

  69. 69 Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brasil, no. 4-7, abril-junho de 1874: 343. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=074594&pesq=

  70. 70 Ilustrativa deste posicionamento nos é uma publicação intitulada “A Maçonaria e o Catolicismo”, composta de trechos extraídos de um discurso supostamente proferido por um maçom chamado Poupelle, da Loja Le Réveil de l’Orient. Criticando as pretensões da Igreja Romana quanto ao domínio das consciências, acusa-a de privar a sociedade daquilo que considera serem as “legítimas liberdades”, transformando-a em uma espécie de “convento” sob a mão de ferro de uma Igreja altamente hierarquizada, dogmática e centralizada no pontífice romano. Ver Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 7, julho de 1873: 513-517.

  71. 71 Boletim do Grande Oriente do Brazil, no. 9-10, setembro-outubro de 1873: 712. http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=&pagfis=1

  72. 72 Silva, Carvalho, “Ultramontanismo, Maçonaria e Protestantismo no contexto da Questão Religiosa (1872-1875)”.

  73. 73 Silva, “A ‘semântica do mal’ na imprensa ultramontana no Brasil da segunda metade do século XIX.

  74. 74 Di Stefano, “Disidencia religiosa y secularización en el siglo XIX iberoamericano”.

  75. 75 Michel Goulart da Silva, “Maçonaria e anticlericalismo no jornal O Livre Pensador”. REHMLAC+ 12, no. 2 (2020): 76, https://doi.org/10.15517/rehmlac.v11i2.38499

  76. 76 Os representantes do Grande Oriente do Brasil tendo assumindo o rito escocês, enquanto os beneditinos, o francês irregular. Ver Andrade, A maçonaria no Brasil (1863-1901); Gonçalves, “Periodismo maçônico e cultura política na Corte Imperial do Brasil (1871 – 1874)”.

  77. 77 Zanca, Di Stefano, Fronteras disputadas.

  78. 78 Ana Rosa Cloclet da Silva; Leonardo Henrique de Souza Silva, “A construção discursiva do conceito de ‘heresia’ no contexto da questão religiosa: uma análise a partir do jornal O Apóstolo (1871-1875)”, História Unicap 7, no. 14 (2020): 450-466.

  79. 79 Ressalva: a constatação baseia-se nos resultados apresentados pelo mecanismo de buscas por palavras-chave disponibilizado pelo portal da Hemeroteca Digital Brasileira. Neste caso, pode-se dizer que não necessariamente o vocábulo não tenha sido utilizado nas fontes, mas que o mecanismo de buscas não conseguiu localiza-lo.

  80. 80 Ana Rosa Cloclet da Silva, “Periodismo ultramontano y la transnacionalización del catolicismo decimonónico desde Brasil”, Debates de Redhisel, vol. 3 (2021): 59-82.

  81. 81 Reinhart Koselleck, História de conceitos (Rio de Janeiro: Contraponto, 2020).

  82. 82 Chegou-se a tal constatação a partir do mecanismo de buscas por palavras-chave disponibilizado pelo portal da Hemeroteca Digital Brasileira, o que não significa necessariamente que, em todas as edições digitalizadas, não haja uso do conceito. Este apenas não é detectado pelas ferramentas de busca.

  83. 83 “Mantendo relações próximas com as ligas anticlericais do estado de São Paulo e com grupos da Maçonaria, o periódico nasceu da dedicação de seu fundador e de um grupo de maçons pertencentes à Loja Luso-Brasileira. Utilizou caricaturas e um tom irônico para propagar sua campanha anticlerical. De início foi distribuído gratuitamente. Em seu primeiro número, A Lanterna afirmava ter como objetivo a propaganda anticlerical e a denúncia de que a Igreja Católica propagava a miséria e a ignorância pelo mundo. Constituiu-se como órgão de defesa de uma sociedade laica, atrelada ao progresso e à civilização, tidos como polo oposto ao clericalismo e seus dogmas. Estado e Igreja deveriam ser definitivamente separados, assim como política e religião.” Ver Carolina Vianna Dantas, Dicionário Histórico-Biográfico da Primeira República (1889-1930) (Rio de Janeiro: FGV, 2010), 1.

  84. 84 Dantas, Dicionário Histórico-Biográfico da Primeira República (1889-1930).

  85. 85 Barata, “Maçonaria, sociabilidade ilustrada e independência (Brasil, 1790-1822)”.

  86. 86 Pedro Calmon, Vida de Dom Pedro I: o rei cavaleiro (São Paulo: Ed. Nacional, 1943).

  87. 87 William Almeida de Carvalho, “Pequena história da Maçonaria no Brasil”, REHMLAC+ 2, no. 1 (2010): 30-58, https://revistas.ucr.ac.cr/index.php/rehmlac/article/view/6609

  88. 88 Medeiros, “Dom Vital: a Questão Religiosa e a crise político-institucional no Segundo Reinado”.

  89. 89 Silva, “A ‘semântica do mal’ na imprensa ultramontana no Brasil da segunda metade do século XIX”, 63.

  90. 90 A saber: o Boletim do Grande Oriente do Brazil: Jornal Official da Maçonaria Brasileira (1871-1899) e o Boletim do Grande Oriente Unido e Supremo Conselho do Brazil: Jornal Official da Maçonaria Brazileira (1873-1877), disponíveis no portal da Hemeroteca Digital Brasileira.

  91. 91 Não significa dizer, entretanto, que para os demais casos o conceito de anticlericalismo tenha, invariavelmente, sido assumido na sua positividade qualitativa pelos maçons. Cabe-nos ressaltar que anticlericalismo nem sempre se porta como um conceito histórico, em termos koselleckianos, exigindo do pesquisador que o maneja a consciência epistemológica de seu funcionamento, também, como uma categoria-analítica. Ver Zanca, Di Stefano, Fronteras disputadas; Di Stefano, “Disidencia religiosa y secularización en el siglo XIX iberoamericano”.

  92. 92 Koselleck, Futuro Passado, 115.